ISSN 2359-5191

03/11/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 126 - Ciência e Tecnologia - Instituto de Química
Experimentos em astrobiologia avançam para fora dos laboratórios
Em maio deste ano, primeiro teste com balão estratosférico foi realizado em São Carlos
Imagem captada pela sonda estratosférica durante a missão Garatéa/fonte: sonda estratosférica

Como a vida se originou no planeta? Existe vida fora da Terra? Essas são algumas das questões que centralizam os estudos no âmbito da astrobiologia, um campo de atuação recente, instigante e que há alguns anos vêm crescendo no Brasil.

Fabio Rodrigues, professor do Instituto de Química da USP e coautor do livro “Astrobiologia: Uma Ciência Emergente”, explica: “A área se propõe a entender, por um ponto de vista mais amplo, a vida e suas relações com o planeta, abordando origem, evolução, futuro da vida e distribuição, seja na Terra ou eventualmente fora dela”.

Impulsionada principalmente pelo grande apelo popular, no contexto de disputa espacial pós 2ª Guerra Mundial, a pesquisa em Astrobiologia possui dois objetos de estudos muito claros: “Estudar a vida como a gente conhece aqui na Terra e conectar com estudos sobre condições de habitabilidade em outros planetas”, esclarece o professor.

Os experimentos na área têm por objetivo recriar ambientes extremos análogos aos existentes - tanto na Terra, quanto fora dela - na tentativa de entender os mecanismos de sobrevivência de microorganismos nesses meios.

Essas simulações são realizadas em laboratório, com auxílio de equipamentos responsáveis por reproduzir diferentes parâmetros (temperatura, pressão, incidência de raios ultravioleta) de acordo com o ambiente que se deseja recriar.

Entretanto, como explica Fabio, a recriação desses ambientes extremos em laboratório se mostra, de certa forma, limitada: “Você não consegue simular aqui em laboratório um ambiente real, sem a gravidade por exemplo”.

Nesse contexto, o campo da astrobiologia busca quebrar as fronteiras e avançar com seus experimentos para o exterior das salas: “Aqui no laboratório costuma-se realizar simulações variando-se um ou poucos parâmetros juntos. Porque não tentar realizar experimentos que possam analisar mais de um parâmetro por vez? O desafio é a gente simular diferentes parâmetros juntos”.

Dando início a esse processo, no mês de maio deste, integrantes do Grupo Zenith da Escola de Engenharia de São Carlos da USP lançaram uma sonda experimental para a estratosfera. A missão “Garatéa”, como ficou conhecida, também teve a participação de Fabio e de um grupo do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, em Campinas, que coordenaram os experimentos de astrobiologia realizados.

Missão Garatéa

O experimento principal consistiu em lançar microrganismos extremófilos (encontrados em ambientes extremos da Terra) a aproximadamente 32 quilômetros de altitude: “Era um balão cheio de hélio montado pelo pessoal de São Carlos no qual a gente pôs o experimento químico e biológico dentro. Então a gente expôs algumas bactérias. O balão foi subindo, quando chegou acima de 10 quilômetros de altitude, ele abriu a tampa que estava protegendo o experimento no interior”, conta o professor.

O grupo Zenith da Escola de Engenharia de São Carlos da USP foi o responsável por montar o balão estratosférico/fonte: divulgação

O intuito do experimento era analisar o comportamento dos microrganismos nas condições de estresse da alta atmosfera: “A alta atmosfera é um ambiente frio, bem mais seco, com muito menos água disponível, pressão mais baixa e muito mais UV. É um ambiente parecido com a superfície marciana, por exemplo”.

Após cerca de duas horas e meia na estratosfera, o equipamento retornou ao solo por meio de um paraquedas, aterrissando na cidade de São Sebastião da Grama, a 145 quilômetros do ponto de lançamento, em São Carlos.

Após análise em laboratório, o experimento – que representou o primeiro teste realizado com balão estratosférico – apresentou resultados excelentes.

O Garatéa provou ser uma plataforma confiável de pesquisa para sondar o ambiente estratosférico. Muitos dos microrganismos resistiram à missão, o que significa que as bactérias observadas são capazes de sobreviver em Marte, ambiente que apresenta condições análogas as da estratosfera.

Como reconhecimento ao sucesso da missão Garatéa, o grupo venceu o prêmio de 2º lugar na categoria “melhor experimento”, no Global Space Balloon Challenge, competição organizada pela Universidade de Stanford e pelo Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT).

A tampa protegendo o experimento biológico se abriu na estratosfera, expondo as bactérias às condições extremas de sobrevivência/fonte: divulgação

Projetos Futuros

A perspectiva agora é realizar outras missões como a Garatéa: “Estamos pensando em repetir o experimento no final de outubro para aprimorar um pouquinho. A ideia nossa é complicar mais esses experimentos. Dessa vez a gente só pôs a bactéria lá e expôs, a gente pode crescer ela lá, metabolizar ela. Podemos por um equipamento para ficar medindo “in situ” o que está acontecendo. O que fizemos agora foi recolher e depois medir em laboratório. Podemos começar a medir em tempo real para simular também esse tipo de situação”.

Segundo Fabio, uma opção alternativa seria pensar em outras simulações, como diretamente no ambiente espacial, através de satélites. “Esses experimentos, entretanto, são mais complexos de serem viabilizados.”

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