Pedro Enrique Navas Suárez, pesquisador de mestrado no Laboratório de Patologia Comparada de Animais Silvestres da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP (LAPCOM, FMVZ), passou os anos de 2015 e 2016 analisando amostras histopatológicas colhidas em cadáveres de cervídeos necropsiados pela USP entre 1995 e 2015. Seu objetivo inicial era formar um arquivo com informações relacionadas a doenças e outros processos patológicos que acometem os cervídeos. No entanto, o número considerável de mortes causadas por atropelamentos fez com que a pesquisa levantasse perguntas de outro tipo.
Um estudo da Universidade Federal de Lavras (UFLA-MG) divulgado este ano calculou que, só no Brasil, cerca de 475 milhões de animais silvestres são atropelados anualmente. Isso significa 15 mortes por segundo nas estradas e rodovias do país. Um número alarmante para Suárez, que, ao estudar as espécies veado-catingueiro e cervo-do-pantanal, questiona: “Quão importante é o atropelamento como risco de extinção para a biodiversidade brasileira?”
Os resultados parciais da pesquisa denotam uma grande parcela de cadáveres de animais adultos, igualmente divididos entre fêmeas e machos. Considerando-se que os indivíduos com essas características compõem a parcela reprodutivamente apta da população, essa informação implica em um possível risco para a conservação da espécie. No caso do cervo-do-pantanal, cervídeo já ameaçado pela destruição de seu habitat, é uma preocupação válida e que deve ser levada em conta.
Antes disso, porém, Suárez procurou estabelecer uma base estrutural para a pesquisa, identificando primeiro se o animal atropelado estava doente ou sadio. Dados feitos a partir de 130 análises sobre o veado e mais de 70 sobre o cervo mostraram que um número significativo de cervídeos estava de fato acometido com alguma enfermidade. A mais recorrente foi a pneumonia, que no veado-catingueiro atingiu mais de 50% dos animais. O registro dessas informações motivará os encarregados do processo de necrópsia a prestar mais atenção a esses aspectos, julga o pesquisador.
Veado-catingueiro, espécie de porte pequeno e amplamente distribuída no Brasil. Foto: G1
Um dos problemas enfrentados durante o estudo foi a falta da conservação adequada das amostras coletadas dos cadáveres. A natureza da transmissão dessas doenças – bactérias, vírus ou protozoários – só pode ser determinada com a realização de cultura de tecidos orgânicos ou através de técnicas de biologia molecular, algo impossível com animais mortos 20 anos atrás.
Suárez pretendia utilizar os cadáveres que chegassem à USP em 2015 e 2016, mas nesses dois anos não chegou nenhum novo cervídeo na Universidade. Em apelo às clínicas e centros de reabilitação de animais silvestres, Pedro Suárez pede que mais doações de corpos sejam feitas à Universidade. “O cadáver de um bicho em uma estrada que não é necropsiado engrossa o número de animais mortos, mas para aí, como apenas um dado. Não sabemos porque ele morreu”.