Os contos “As margens da alegria” e “Os cimos”, primeiro e último, respectivamente, do livro Primeiras estórias (1962), de João Guimarães Rosa são analisados comparativamente objetivando investigar o olhar da personagem infantil em relação ao espaço ao seu redor. Ambos os contos trazem a figura de um Menino que se desloca de casa para um lugar onde uma grande cidade está em fase de construção. Acredita-se que o espaço seja um elemento que possibilita conceber a imersão dessa personagem, enquanto sujeito perceptivo, em um mundo socialmente partilhado. Dessa forma, a análise feita se sustenta em teorias que discutem o espaço ficcional enquanto materialização das experiências humanas, nos contos, mais especificamente, das percepções e experiências da personagem infantil.
O presente trabalho consiste numa pesquisa que gira em torno das acepções que o espaço ficcional assume na literatura brasileira desde suas primeiras manifestações ainda em períodos coloniais, até a terceira fase do modernismo, que corresponde à geração de 45, na qual está inserida a obra de João Guimarães Rosa. Nesse sentido, é explanado um panorama do regionalismo na literatura brasileira a partir do percurso teórico apresentado por Antonio Candido que aborda a forma como os textos ficcionais pressupõem o espaço seja em sua dimensão literal ou simbólica. Nessa última acepção, o leque do enfoque espacial abarca elementos próprios da modernidade, a saber: o espaço do narrador, o da linguagem e o do leitor. Esses elementos são debatidos na perspectiva da obra rosiana de uma forma geral e mais especificamente nos contos As margens da alegria e Os cimos, primeiro e último, respectivamente, do livro Primeiras estórias (1962). Em se tratando dos contos, é feita uma análise comparativa evidenciando aspectos em comum, notáveis na composição estrutural; e diferenças evocadas pela percepção da personagem infantil no que tange ao espaço. O espaço caracteriza-se como elemento que possibilita conceber a imersão da personagem infantil, enquanto sujeito perceptivo, em um mundo socialmente partilhado. O deslocamento da personagem, tanto físico quanto interno, evoca a imaginação e acena para um aprendizado existencial. Por outro lado, em se tratando de conto enquanto gênero, a narrativa assume uma dubiedade associando ficção poética e realidade. Assim sendo, também são discutidos aspectos relacionados ao contexto de produção da obra de Guimarães Rosa, vinculados espacialmente a uma perspectiva mais urbana, própria de um Brasil que passava por um surto de modernização. A percepção do entorno pela personagem infantil referencia o estudo do espaço ficcional nos contos de João Guimarães Rosa.