Este artigo analisa aspectos da personagem de ficção em duas narrativas canônicas de língua portuguesa: Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa, e Que farei quando tudo arde?, do escritor português António Lobo Antunes. O objetivo é, através de uma leitura que parte da proposta crítica de Silviano Santiago (“wilderness” ou “qualidade selvagem” do texto literário) e das proposições teóricas de Jacques Derrida (“semântica do indecidível”), demonstrar como a construção ficcional dessas personagens de sexualidades dissidentes impulsiona a própria diegese, conformando as textualidades também dissidentes dessas duas obras. A análise empreendida indica que o processo de metamorfose identitária experienciado por essas duas “personagensmônada” e revelado ao final de suas respectivas narrativas obriga o leitor a um constante reposicionamento interpretativo, evidenciando que essas personagens textualizam o famoso axioma “character is plot, plot is character”.