A novela Campo Geral, também caracterizada por Guimarães Rosa como um poema, é parte constitutiva da obra maior Corpo de Baile, publicada em 1956, e trata da vida de uma família muito pobre que vive no interior de Minas Gerais, cujo cotidiano gira em torno de sua subsistência através do trabalho necessário para alcança-la. As representações do trabalho têm papel central na obra e as diferenças entre a forma como eles são representados apontam para a possibilidade do estabelecimento de certas relações entre esses regimes de trabalho e determinadas características das personagens A atividade que possibilita àquela família sua subsistência também incide sobre determinados membros dessa mesma família de forma potencialmente cerceadora, como uma espécie de tesoura de poda da subjetividade. O movimento executado por Guimarães parece consistir em observar e captar certos aspectos particulares dessa realidade para, a partir disso, trazer à tona e exprimir questões que transbordam essa família e essa realidade particular e dizem respeito à humanidade de forma mais genérica, pra além dessas particularidades, revelando, como formulou Antonio Candido, a universalidade da região. A partir da análise das personagens do núcleo da novela e a relação de Miguilim com estes, este ensaio busca discutir a centralidade das representações do trabalho para a construção da narrativa e os recursos utilizados pelo autor na direção da superação do regionalismo pitoresco comum em sua época.Palavras-chave: Campo Geral; Miguilim; Realismo; Guimarães Rosa; Representações do trabalho.DOI: https://doi.org/10.47295/mgren.v10i2.3182
Apesar das bases da jornada do herói estarem afixadas pelo Monomito de Joseph Campbell (1949), as representações de heroísmo sofreram forte influência da doutrina cristã do maniqueísmo. A figura do paladino do bem que luta contra as forças do mal são exploradas fartamente nas produções cinematográficas hollywoodianas. João Guimarães Rosa (1956) na obra Grande Sertão: Veredas oferece um mundo misturado, onde o bem e o mal são inerentes a condição humana. Ambientado também no sertão, o filme Bacurau (2019) de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles propõe o embate entre habitantes de um vilarejo do nordeste e mercenários estadunidenses. Partindo desse pressuposto, este estudo busca estabelecer um paralelo entre alguns personagens do filme Bacurau com o conceito de universo misturado do sertão rosiano, de David Arrigucci Jr, com intuito de traçar um perfil do herói complexo e multifacetado que se distingue das narrativas maniqueístas desenvolvida pelo cinema hollywoodiano. Para tanto, utiliza-se as contribuições de Arrigucci Jr (1994) e Candido (1957), a fim de concluir que nas duas obras, o herói é representado na profundidade da ambivalência humana em um ambiente hostil e real, no qual o herói maniqueísta e limitado é uma mera caricatura.Palavras-chave: Literatura comparada. Jornada do herói. Maniqueísmo. Guimarães Rosa. Bacurau.DOI: https://doi.org/10.47295/mgren.v10i2.3265