Diferentemente de outras teorias mais próximas da retórica, a semiótica da Escola de Paris nunca foi muito pródiga ao tratar dos problemas de persuasão e argumentação. A partir de uma constatação simples como essa, procuramos, neste artigo, pôr à prova certos dispositivos semióticos que têm suas consequências nesse domínio, a começar pela problemática modal do crer e do saber. Seus valores são examinados num tipo de situação específi ca, a saber, quando as personagens confrontadas se acham em circunstância de ameaça imediata a sua integridade física. Nesse sentido, discutimos três tópicos principais: (i) a interação dos valores modais do saber e do crer, componentes de um mesmo universo cognitivo; (ii) as modulações tensivas do medo e das paixões correlatas; (iii) as formas de raciocínio inferencial mobilizadas pelas personagens do relato, e notadamente as ilações abdutivas postas em cena. O texto escolhido para a verifi cação do alcance e dos limites de tais dispositivos semióticos é o conhecido conto de Guimarães Rosa, ?Famigerado? (Primeiras estórias, obra originalmente publicada em 1962).
Guimarães Rosa renova a perspectiva regionalista no Brasil ao ultrapassar o pitoresco e o
exótico regional quando apresenta procedimentos literários, os quais destacam expressividades linguísticas e temáticas com base na voz do homem do sertão. Neste artigo, num primeiro momento, são apresentadas considerações a respeito da obra de Rosa em relação ao ponto de vista regionalista brasileiro de forma a contextualizá-la; em seguida, como foco principal, intenta-se mostrar como pode estar presente no conto “Antiperipleia” um discurso ardiloso, ou persuasivo, por parte do narrador, que passa a ser sujeito do discurso ao invés de objeto de observação passivo. Para dar conta desta tarefa, foi revisitada a fortuna crítica sobre o autor, incluindo Bosi (1988), Coutinho (1991), Candido (2002) e Galvão (2000), dentre outros. Espera-se, com isso, contribuir com os estudos acerca da voz narrativa, na obra de Rosa.