A biologia das células-tronco embrionárias e os processos de sinalização que induzem sua auto-renovação são objeto de estudo da pesquisadora Mariana Lemos Duarte, no Instituto de Química da USP.
Uma das singularidades da célula-tronco é a sua característica indiferenciada, isso é, não tem função definida no organismo mas apenas o potencial de diferenciar-se para células específicas. Segundo a pesquisadora, no entanto, ainda não compreende completamente o que as mantém indiferenciadas.
De acordo com Mariana, o estudo tem o objetivo de investigar a participação da proteína quinase C na regulação de atividades celulares. Ela é responsável pela fosforilação de diversas outras proteínas das células, processo que transfere grupos fosfato de ligações energéticas produzidas pelo organismo para as células, modulando sua ação no organismo ou até mesmo ativando e desativando seu funcionamento. Isso acontece por meio da interferência na estrutura molecular da proteína, isso é, o modo como ela assume sua forma tridimensional que define o desempenho de sua função celular.
O trabalho da pesquisadora foca na investigação da função das proteínas quinase atípicas (aPKCs) nesse curso celular. Para isso, faz uso do inibidor peptídeo pseudossubstrato das aPKCs: “Coloco o inibidor na célula-tronco e analiso o perfil das proteínas que reduziram a fosforilação”. Isso ajuda a identificar quais delas dependem da quinase para serem fosforiladas: “Se eu encontro o substrato que aPKC fosforila, talvez esse substrato seja importante para manter a célula tronco indiferenciada.” A resposta da protéina quinase ao inibidor ajuda a entender a sua relação com a auto-renovação das células-tronco.
Inibir o processo de fosforilação da aPKC pode, então, alterar a característica da célula indiferenciada, possivelmente dando início a um processo de diferenciação específica. Mariana afirma, no entanto, que “esse processo de diferenciação ainda não foi visualizado em laboratório na pesquisa”, uma vez que mais experimentos devem ser realizados para comprovar essa hipótese.
Como consequência da intervenção, a pesquisadora notou a redução da secreção de lactato e também da atividade da enzima lactato desidrogenase, o que sugere que a síntese de energia da célula-tronco acontece, majoritariamente, por vias anaeróbicas — cujo um dos resultados é o lactato, produto da fermentação anaeróbica que gera ATPs, moléculas de energia — e que esse processo tem como um de seus reguladores as aPKCs. Além disso, Mariana detectou um aumento no consumo de oxigênio, o que indica que a célula cujas aPKCs foram inibidas passaram a realizar síntese de energia por vias aeróbicas.
O estudo demonstra a importância do papel das aPKCs na regulação da glicólise anaeróbica — isso é, por meio da fermentação — no processo de auto-renovação das células tronco indiferenciadas. “A célula-tronco com aPKCs ativadas consome pouco oxigênio, muita glicose e produz muito lactato. Quando a inibo, isso muda”, explica a pesquisadora. A principal contribuição da pesquisa, entretanto, é a da identificação das proteínas substrato fosforiladas pela quinase C e sua importância para a característica indiferenciada das células-tronco.