Organizar por ordem de relevância os processos jurídicos brasileiros e, assim, aprimorar a segurança pública das instituições é o principal objetivo da pesquisa de Marcelo Finger, do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP. A computação aliada ao direito trouxe questões interessantes em relação ao funcionamento do judiciário.
Atualmente, são cerca de 50 mil processos existentes no STF (Supremo Tribunal Federal) e 250 mil no STJ (Superior Tribunal de Justiça). É uma quantidade de dados muito grande, e é justamente com essas informações que Finger trabalha. Em cada caso, todos os julgados possuem uma ficha eletrônica com um resumo do que aconteceu. Ali estão os fatos principais, como quem é o relator, qual decisão foi tomada, além da ementa, que é o mais importante. "Nas fichas temos as leis na qual a decisão foi baseada, e a jurisprudência, ou seja, outros julgados na qual aquela decisão foi baseada", afirma o pesquisador. O conjunto de processos torna-se especialmente complexo quando começa-se a trabalhar com referências.
"Um certo projeto faz referência a outros julgados através do número de identificação, para dizer onde se baseou", diz Finger, "implicitamente existe uma rede, assim como a internet. É como se eu clicasse em um julgado e fosse pulando para outros relacionados". Assim, enxergando os processos como uma grande rede, foi criado o link: "Construímos essa rede, e agora estamos aplicando técnicas de análises de redes complexas de computador à rede de julgados do STF e STJ. É um trabalho de computação cuja temática vem do direito", afirma Finger.
A ideia central, a partir daí, era colocar cada processo em ordem de relevância. "Assim como o google faz um cálculo, quando se pesquisa, para a ordem de relevância, queríamos selecionar os processos mais importantes e menos importantes". Foram definidos dois fatores: se muitos casos se referem a certo processo ele se torna relevante, se o mesmo cita um outro, o outro já herda a importância. "Isso é um processo interativo, com algorítimos", afirma Finger.
No início, o método não funcionou muito bem. Após novas tentativas houve uma melhoria, mas não satisfatória: "Melhorou, mas não tanto. Queríamos saber o porquê". A compreensão para tal problema veio com o entendimento de como funciona o judiciário, com uma descoberta interessante: "Boa parte das matérias são meramente processuais, ou seja, para saber se um pedido é acatado ou não, se algo está no processo ou não. Não são matérias de fundo, como mensalão ou julgar pedidos de aborto. A minoria dos processos são verdadeiramente relevantes; a maior parte deles, como afirma Finger, "é para averiguar se a vírgula está sendo respeitada ou não."
Assim, outro problema surgiu. Agora, um novo método computacional que consiga separar matérias processuais das de fundo está sendo desenvolvido: "Não conseguimos colocar os processos em ordem de relevância, pois isso só acontecerá quando conseguirmos separar matérias processuais e de fundo. Agora estamos desenvolvendo um método para separá-las". A partir, daí será analisada a precisão do método, para então saber se a pesquisa trará resultados positivos: "É um trabalho em andamento, já descobrimos muita coisa, mas vamos avaliar a precisão, ver se isso dá certo."
A grande vantagem da pesquisa de Finger é propiciar uma investigação, usando dados públicos, sobre o funcionamento das instituições. Como ele mesmo diz, "estamos aprendendo a conhecer o sistema, quando se aprende isso, pode-se aprimorar. Estamos contribuindo para a segurança jurídica". O ganho vai tanto para o lado do direito quanto para o da computação: "Temos o lado da relevância social, de conhecer melhor as instituições fundamentais no país, mas também queremos desenvolver modelos e softwares. Nesse caso é algo mais circunscrito a área", diz o pesquisador.