ISSN 2359-5191

10/12/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 127 - Saúde - Instituto de Ciências Biomédicas
Dupla de genes é mais eficiente na terapia gênica do câncer
Vetor viral que carrega p53 e p16 obteve, em camundongos, melhores resultados do que com genes isolados
O câncer é o principal alvo da terapia gênica no mundo (Foto: reprodução)

A transferência de genes é uma das esperanças para o tratamento do câncer (leia matéria publicada na AUN). No mundo todo, são algumas centenas de protocolos clínicos sendo desenvolvidos para essa doença, com diferentes genes-alvo. O laboratório da professora Eugênia Costanzi-Strauss, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, trabalha na construção de um vetor viral com dois genes-alvo atuando em conjunto, produzido totalmente em território nacional, e comprovou que essa versão é mais eficiente do que aquelas que carregam os genes sozinhos.

p53 e p16: genes supressores de tumor

O gene supressor de tumor mais próximo de ir para a clínica, que possui o maior número de protocolos clínicos ao redor do mundo, é chamado de p53 conhecido também como guardião de genoma. Cerca de 50% dos tumores humanos têm mutação nesse gene; ele é disfuncional ou aparece na forma mutada. Os outros 50% têm mutações nas vias de p53, de tal forma que interfere na expressão da molécula, como uma alteração no gene responsável por degradá-la. "De forma básica, 100% dos tumores humanos têm problemas na via do p53, com mutações que, direta ou indiretamente, o afetam", explica a professora Eugênia. Essa molécula é responsável por uma resposta de estresse muito forte na célula: se houver uma quebra de DNA, por exemplo, a fita é despareada, o p53 reconhece isso e ativa uma maquinaria de reparo.

Existem muitos protocolos clínicos com p53, que estão sendo testados em tratamentos junto com a quimioterapia. A dose de quimioterápicos que o paciente precisará tomar é menor quando é associada com o p53, o que leva a efeitos colaterais mais brandos. "Não restam dúvidas de que a quimioterapia funciona. Só que, às vezes, a dose é tão alta que compromete a vida do paciente", diz. Cerca de 70% dos protocolos em que a molécula é utilizada são para o tumor de pulmão o mais frequente na população mundial. O pulmão é um lugar de fácil acesso para administrar vetores, da mesma forma que o cérebro – por estereotaxia, um tipo de biópsia. No caso do câncer de pulmão, existem protocolos em que o vírus é borrifado e inalado. Esse é um fator importante na terapia gênica: determinar como os vírus serão levados até as células-alvo.

Outro gene supressor famoso é o p16INK4a, conhecido apenas por p16. Ele é o gene do envelhecimento. A maioria das células tumorais perdem essa molécula; quando ela é retirada, a célula ganha vida eterna. Segundo Eugênia, praticamente 100% dos tumores humanos tem defeito na via de p16.

Vetor verde e amarelo

No laboratório do ICB, o grupo do laboratório de Terapia Gênica, sob coordenação da professora Eugênia, começou construindo vetores virais que carregavam p16 e p53. Os ensaios foram feitos em camundongos com linhagens do tumor maligno mais comum no cérebro, o glioblastoma. A primeira tentativa foi construir vetores virais com p16 ou p53 isolados, mas os resultados mostraram que apenas um supressor não era suficiente. "Câncer é uma doença multigênica. A maioria dos tumores tem problemas nos dois genes", explica.

A ideia é construir vetores que carregam dois genes supressores de tumor, chamados de bicistrônicos, o p16 mais o p53. Quando esse vetor entra na célula, duas vias são corrigidas simultaneamente, afirma a professora. Eugẽnia acrescenta que esse é um tratamento de remediação: o gene mutado continua existindo, o que pode interferir na resposta ao tratamento. "O que é feito é remediar ao colocar uma coisa extra na célula", esclarece.

O grupo construiu o vetor bicistrônico primeiro num vetor retroviral. Os experimentos mostraram que, na cultura de células, esse tipo viral é ótimo. Mas, explica Eugênia, se houver um tumor que deve receber um tratamento no local, o retrovírus não tem título suficiente para isso. A saída é usar outro vetor de transferência gênica: o adenovírus, que pode ser injetado diretamente no tumor.

Hoje, o que é mais trabalhado no laboratório do ICB é o tratamento de câncer de pulmão com adenovírus bicistrônico p16-p53, muito mais eficiente do que as versões monocistrônicas, segundo a professora. "Temos ensaios em camundongos em que as células tumorais humanas que não têm nem o p16 nem o p53 são injetadas no animal", conta. "O camundongo desenvolve o tumor subcutâneo, nós injetamos o vírus dentro da massa tumoral e acompanhamos o crescimento do tumor por até 30, 40 dias", complementa. Os resultados mostram que o tumor, se comparado com um animal que não recebeu esse vetor terapêutico, regride de tamanho; ele não desaparece totalmente, mas cresce mais lentamente. "A velocidade de dobramento dessas células é muito mais baixa, o que cria possibilidade para tratamentos", afirma a professora.

O que o grupo pretende fazer agora é combinar esse adenovírus com quimioterápicos. Eugênia salienta que dificilmente a terapia gênica no câncer vai ter efeito sozinha; é preciso utilizar quimioterápicos e imunoterapia em conjunto com a técnica. "Câncer é uma doença do organismo. Há uma massa tumoral alterada, mas as células ao redor também estão modificadas", afirma. Esses tratamentos, em parceria, podem fornecer uma melhora e um tempo adicional importante no quadro clínico de pacientes com câncer.

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