Os preparativos para uma gravidez segura devem começar antes mesmo da concepção. Porém, segundo pesquisa do Núcleo de Estudos Epidemiológicos na Perspectiva de Enfermagem e Saúde Coletiva (Nepesc) da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, a maioria das gestantes usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS) não sabe disso. O resultado do estudo sugere que é preciso estabelecer uma política pública de saúde acerca do preparo pré-concepcional.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) indica uma série de preparativos para uma gestação saudável. Entre eles estão: orientação alimentar e suplementos de vitaminas e sais minerais; prevenção do uso de drogas lícitas e ilícitas; prevenção de doenças e tratamentos de doenças pré-existentes, como aids; aconselhamento genético; verificação de vacinas; tratamento para quadros de infertilidade. Além disso, o órgão propõe atuação em saúde mental, em questões sociais, na identificação de violência interpessoal, na prevenção de gravidezes sucessivas e também a autonomia de países para estabelecer medidas localmente relevantes, como é o caso do Zika vírus no Brasil.
Na contramão das recomendações internacionais, o SUS parece se ater, sobretudo, à orientação em contracepção e aos cuidados durante a gravidez. Segundo a pesquisadora do Nepesc, Natália Castro de Nascimento, “os serviços de atenção básica pouco têm investido em ações de promoção de uma gravidez. As ações, nessa área de atenção, são predominantes em relação à contracepção.” Isso fica evidente nas práticas da assistência básica, mais voltadas à distribuição e incentivo do uso de camisinha e pílula anticoncepcional para evitar gravidez indesejada, ou à importância do preparo pré-natal, deixando quem deseja ter filho e que ainda não é gestante sem a devida orientação.
Na atenção básica de saúde, existem espaços para a realização do preparo pré-concepcional, mas eles não são difundidos. Nos grupos de planejamento familiar, nas consultas e visitas domiciliares feitas pelos profissionais de saúde, há oportunidades de orientar casais que desejam ter filhos sobre as recomendações adequadas para engravidar. Contudo, segundo a pesquisa, apenas 33% das mulheres grávidas usuárias do SUS já ouviram falar de preparativos para antes da gravidez. Entre elas, a maioria conhecia apenas o básico, como a orientação nutricional, e ficou sabendo por recomendação familiar, não profissional. Além disso, parte do estudo, realizado com 807 mulheres com gravidez planejada, indicou que somente 15,9% delas fez o preparo adequado.
Não se preparar para a gravidez pode ser um grande risco
Realizar os cuidados indicados pela OMS para antes da gravidez não é apenas uma cautela a mais, é fundamental. O preparo pré-concepcional reduz a mortalidade materno-infantil e previne diversas outras complicações da gravidez.
Um dos maiores riscos são defeitos no fechamento do tubo neural do feto, que podem ser evitados com a suplementação do ácido fólico antes da gravidez. Outras deficiências nutricionais como ferro, iodo e cálcio, podem aumentar o risco de partos prematuros, abortos, anemia ferropriva (por falta de ferro), baixa cognição infantil, malformação congênita e baixo peso ao nascer.
O consumo de substâncias inadequadas também pode ter consequências graves. A ingestão de álcool, por exemplo, pode causar aborto espontâneo, defeitos do tubo neural e, também, a síndrome alcoólica fetal.
Além disso, doenças pré-existentes não controladas, como, por exemplo, diabetes, hipertensão e HIV/aids podem interferir nos resultados maternos e infantis. Os cuidados pré-concepcionais diagnosticam a saúde da futura mãe e iniciam tratamentos, caso necessário, evitando esses problemas.
Por todas essas razões as pesquisadoras defendem que o SUS dê mais atenção ao preparo pré-concepcional, como recomendado pela OMS. Por ser um sistema que tem por objetivo a universalidade e integralidade da saúde, uma etapa tão importante para a gravidez não poderia ser deixada de fora. “Há a necessidade de se estabelecer uma política pública de saúde acerca do preparo pré-concepcional e de esforços educacionais visando a formação de profissionais de saúde para o adequado manejo de mulheres em idade fértil. Portanto, o preparo pré-concepcional precisa ser divulgado pelos profissionais de saúde nas UBS, nos consultórios particulares e em todas as instituições de saúde.”