"O número
de transplantes de órgãos e tecidos realizados
no Estado de São Paulo no primeiro bimestre deste ano
foi quase o dobro do registrado no mesmo período do
ano passado. Em janeiro e fevereiro foram 82 os doadores que
tiveram um ou mais órgãos retirados para serem
transplantados em 268 receptores, enquanto em 2003 o número
foi de 42 doadores. Alguns órgãos tiveram uma
oferta ainda maior. A doação de pulmão
e pâncreas, por exemplo, cresceu impressionantes 300%.
Segundo a Central
de Transplantes do Estado , a ampla divulgação
desse procedimento na mídia no começo do ano,
em razão, principalmente, do transplante cardíaco
realizado no ator Norton Nascimento, é a maior responsável
por essa marca histórica.
transplante
infantil |
No
entanto, seria simplista afirmar que esse fato é
o único responsável pelo aumento do número
de doações de órgãos, que
vem crescendo de forma consistente há anos. Desde
1997, o número de transplantes deu um grande salto,
com a aprovação da Lei 9.434, a chamada
Lei dos |
Transplantes.
Ela permitiu a criação do
Sistema Nacional de Transplantes, órgão
ligado ao Ministério
da Saúde que gerencia 22 centrais de notificação
e captação de órgãos estaduais,
além das oito regionais. A Lei de Transplantes
criou polêmica pelo artigo que considerava qualquer
cidadão potencial doador, a não ser que
ele se manifestasse em contrário na sua cédula
de identidade. Contudo, o impacto desta lei vai muito
além desse artigo, que inclusive raramente é
seguido à risca pelos Serviços de Procura
de Órgãos. |
Com a criação do sistema foi possível
colocar em prática a famosa lista única. "Ao
contrário do que muitos pensam, a lista única
não funciona por ordem de chegada, e sim obedece a
vários critérios que determinam a urgência
do transplante em cada paciente", explica o coordenador
do Serviço de Procura de Órgãos em Ribeirão
Preto, Gustavo de Oliveira. Desde o primeiro transplante renal,
realizado no Hospital das Clínicas da capital em 1965,
o Estado de SP esteve na vanguarda dessa área da medicina.
Muito disso se deve aos esforços dos hospitais ligados
às faculdades de medicina. Em São Paulo, todos
os Serviços de Procura de Órgãos são
organizados por hospitais públicos universitários:
Hospital das Clínicas de SP e Ribeirão Preto,
Hospital São Paulo, Santa Casa, Unicamp, Unesp S. J.
do Rio Preto e Unesp Botucatu. Os transplantes realizados
nesses hospitais são totalmente gratuitos, e seus custos,
em média de 35 mil reais por operação,
são pagos pelo Sistema Único de Saúde.
"Os
Hospitais das Clínicas, em São Paulo e Ribeirão
Preto, são considerados os melhores lugares do
Brasil para realização de transplantes." |
João Gilberto Maksoud-Instituto
da Criança do HC |
Os Hospitais das Clínicas, em São Paulo e Ribeirão
Preto, são considerados os melhores lugares do Brasil
para realização de transplantes. Na unidade
da capital são feitas as cirurgias de coração,
pulmão, fígado, rim, medula, córnea e
pâncreas. Muitas vezes são feitas cirurgias duplas
e entre pacientes vivos. O rim, por exemplo, órgão
que por ser duplo permite que doadores vivos cedam um deles
rins para pacientes compatíveis. "A falta de compatibilidade
entre doadores e receptores, aliás, é um dos
grandes responsáveis pela fila do transplante ainda
ser longa. Para poder receber qualquer órgão
de outra pessoa, o paciente deve ter o mesmo tipo sanguíneo.
Além disso, cada órgão tem suas particularidades,
por exemplo, para transplante de rim é preciso haver
compatibilidade genética entre os indivíduos,
para evitar a rejeição. Para pulmão,
a diferença de peso entre doador e receptor não
pode exceder 20%. Ainda há urgências, como a
hepatite fulminante que, se o paciente não tiver o
fígado transplantado em poucos dias, pode causar a
morte", afirma Oliveira.
Cláudio Tadeu, funcionário do Departamento
de Informática da Reitoria, teve seu rim transplantado
em 1998. "O pós-operatório foi complicado,
pois descobriu-se que o doador tinha meningite e eu a tinha
contraído. Mas a competência da equipe do HC
foi fundamental para que agora eu esteja levando uma vida
normal", exalta Tadeu. Apesar dessa qualidade, a Unidade
de Transplante Renal também pena com a longa fila de
espera. "Atualmente temos cerca de 10 mil pacientes na
lista para receber o órgão. Esperamos aumentar
a capacidade de atendimento com a ampliação
das nossas instalações", afirma Sami Arap,
diretor da Divisão de Clínica Urológica
e cirurgião da Unidade de Transplantes Renais.
Euryclides
de Jesus Zerbini |
O
primeiro transplante de coração do Brasil
foi feito por Euryclides de Jesus Zerbini em 1968, menos
de um ano depois da primeira cirurgia do tipo no mundo,
ocorrida na África do Sul. Como não podia
deixar de ser, a operação foi feita no Hospital
das Clínicas. Desde então, o Brasil é
referência em transplantes |
cardíacos,
especialmente após a criação do Instituto
do Coração, que hoje realiza grande volume
de transplantes de coração. Além
disso, o InCor, através de sua divisão de
cirurgia toráxica, é responsável
por transplantes pulmonares de alto risco. |
Transplantes de órgãos em crianças são
especialmente complexos devido à fragilidade dos órgãos
infantis. O Instituto da Criança do HC é referência
em transplantes pediátricos de fígado. "Realizamos
as operações até em recém-nascidos,
com ótimos resultados", afirma o coordenador da
sessão de transplantes do Instituto, João Gilberto
Maksoud. "Já foram feitas 250 cirurgias, que são
de três tipos: de fígado inteiro, com doadores
crianças, de parte do fígado de um doador adulto.
Todos esses procedimentos são doadores já falecidos.
Mas há o transplante intervivos, que eu considero o
mais bonito. Nele, se retira um pedaço do fígado
de um doador adulto e ele é colocado na criança.
Como o fígado é um órgão com grande
poder de regeneração, tanto doador quanto receptor
podem levar uma vida normal após a cirurgia",
orgulha-se Maksoud.
"Ribeirão
Preto é hoje a única cidade do Brasil que
não tem fila de espera para transplante de córnea."
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Em Ribeirão Preto são realizados os mesmos transplantes
do HC paulistano. O grande destaque é o Banco de Olhos
do Hospital, que ficou conhecido por ter córneas sobrando
no estoque. "Nossa eficiência se deve ao plantão
que três funcionários fazem 24 horas por dia no
hospital. Eles são especialmente treinados para abordar
da forma mais sutil possível as famílias de pacientes
recém-falecidos. A nossa taxa de famílias que
autorizam a doação é disparada a maior
do Brasil", afirma Roberto Pinto Coelho, coordenador do
Banco de Olhos. Ribeirão Preto é hoje a única
cidade do Brasil que não tem fila de espera para transplante
de córnea. E ainda assim, o HC de Ribeirão distribui
córneas para várias cidades do interior paulista.
"Para essa 'exportação', ainda há
fila", comenta Coelho. Também se destaca em Ribeirão
o transplante de medula óssea, o mais difícil
para se conseguir doadores compatíveis para os pacientes.
São diversos os problemas que podem levar a pessoa
a precisar de um transplante de órgão. Quando
se desconfia que é esse o caso, o paciente deve procurar
uma das equipes técnicas credenciadas que irão
fazer uma avaliação minuciosa da situação
para efetuar o cadastramento na lista única. Essa equipe
também avalia qual é o grau de prioridade para
o transplante, encaixando o paciente no número de registro
apropriado. A lista é organizada por computador segundo
critérios técnicos. Todas as informações
sobre os transplantes, incluindo consulta ao cadastro, manuais
para cada tipo de paciente e procura de doadores, podem ser
encontradas no site da Central
de Transplantes de SP e do Sistema
Nacional de Transplantes.
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