Ainda que Guimarães Rosa seja um autor conhecido e reconhecido por suas obras vinculadas ao super-regionalismo, é possível notar a influência da literatura fantástica em seus primeiros contos, reunidos e publicados em livro apenas em 2011. Este artigo visa mostrar o momento individual do autor e o momento literário da época em que ele escreveu os contos, considerados imaturos pela crítica. Para isso, analisaremos o conto “Tempo e Destino” e elencaremos aspectos da modalidade do fantástico nele, revelando o que pode ser considerado imitação e o que dessa imitação foi posteriormente assimilado pelo autor para consolidar sua identidade.
O estudo parte da análise do conto “Axolotes”, de Julio Cortázar, com o objetivo de demonstrar a relação entre a constituição do fantástico e a construção das espacialidades da obra, espacialidades, como a dos corpos do narrador e do axolote, verificando como tais corpos situam-se como espaço de devir. Para iluminar a análise, também enfocaremos alguns aspectos do conto "O espelho", de João Guimarães Rosa, e das narrativas “Um animal sonhado por Kafka” e “A bao a qu”, inseridas em O livro dos seres imaginários, de Jorge Luis Borges e Margarita Guerrero. O processo metamórfico que ocorre nas narrativas supracitadas pode ser entendido como exercícios de animalidade que são desencadeados pelas personagens no sentido de testar os limites entre a razão e a imaginação, entre o real e o irreal.
Em “Conversa de bois”, oitavo conto de Sagarana, de Guimarães Rosa, percebe-se a ocorrência do fenômeno do duplo: uma instabilidade do Eu que acarreta no surgimento de uma representação corpórea com as características inversas de um personagem. O Outro de Tiãozinho surge, gradativamente, ao longo da narrativa, na figura dos bois que puxam a carroça de Agenor Soronho. O objetivo deste artigo é investigar como ocorre esse processo e analisar as etapas que culminam no duplo. O amparo bibliográfico buscado é oriundo dos Estudos Literários, com autores como Antonio Candido (1989), Jean Chevalier e Alain Gheerbrant (2017), Walnice Nogueira Galvão (2008), Ana Maria Lisboa de Mello (2000), Mônica Meyer (2008), Otto Rank (2013), David Roas (2014), Clément Rosset (1976) e Irene Gilberto Simões (1998).
O presente artigo trata da questão da personificação dos animais em alguns contos de Clarice Lispector e Guimarães Rosa, analisando a importância e a finalidade desse recurso nas obras, bem como a forma como é explorado. O estudo busca também comparar os textos selecionados, apontar ou identificar as características das fábulas, tendo como base o conceito desse tipo de texto, e verificar se a forma como os autores utilizam essa estratégia influencia o fator de verossimilhança das obras. Além disso, serão abordadas a simbologia de alguns elementos encontrados nas narrativas, sua relação com o enredo e a oposição zoomorfismo X antropomorfismo como fator importante para evidenciar as características psicológicas dos personagens.
Este artigo aborda dois contos do livro Primeiras estórias (1961), de João Guimarães Rosa, “A menina de lá” e “Partida do audaz navegante”. A intenção é refletir de que modo a linguagem do autor revela uma perspectiva não realista no tratamento dado ao enredo; para isso serão trazidos alguns elementos de composição próprios do discurso fantástico tradicional e assim esclarecer pontos de contato e divergência com a realização de Guimarães Rosa. Por meio da abordagem dos efeitos fantásticos da linguagem roseana veremos que em “A menina de lá” a linguagem infantil, fora do uso utilitário do mundo adulto, altera as relações de causa e efeito instaurando o milagre. Em “A partida do audaz navegante” a linguagem infantil, num outro viés, estabelece-se como criação poética e se sobrepõe à realidade tangível, subvertendo-a.
Fita verde no cabelo: nova velha estória, de João Guimarães Rosa, transita entre as vertentes ficcionais que Jaime Alazraki denominou de neofantástico e aquelas que Renato Prado Oropeza subscreveu no fantástico contemporâneo. Em qualquer dos casos, o conto rosiano, que revisita a tradição dos contos maravilhosos e ressignifica Chapeuzinho Vermelho, configura-se como um novo discurso genericamente fantástico, abdicando da hesitação face à manifestação do insólito, que, ainda assim, lhe é próprio. Rosa, resgata a história de Chapeuzinho Vermelho, apresentando-a sob novos olhares, no que tange, em especial, ao trabalho literário com a linguagem, e atualiza, trazendo para seu tempo, aspectos temáticos da referencialidade semionarrativa. Dessa forma,
pode-se remir o trabalho de Lenira Marques Covizzi sobre Rosa e Jorge Luis Borges, injustamente quase sempre esquecido, e, reunindo duas recuperações, uma no nível da ficção, outra no da crítica, ler o texto rosiano como representante do insólito ficcional.
Este trabalho pretende analisar os contos “Umas formas” e “Estória n. 03” integrantes de Tutaméia: terceiras estórias (1979) de João Guimarães Rosa, dando destaque à aliança que se estabelece entre o real e o impossível na engenharia do texto e no arcabouço da linguagem literária. Para tal direcionamento, o viés teórico convocado é a noção contemporânea de fantástico, em particular a concepção endossada por Cortázar (2008), Calvino (2004) e Roas (2011, 2014), dentre outros estudiosos do gênero que destacam a dimensão transgressora da realidade para além do textual, sobretudo a noção de que o fantástico se instala no entrelaçamento do natural e do sobrenatural, do estranho e do familiar, do possível e do impossível.
Este trabalho pretende apresentar o percurso da criação literária, que começa na suspensão das
certezas do mundo real, por meio da construção linguística e da articulação dos enunciados
metafóricos, para, em seguida, reconfigurar a realidade e dar-lhe outro aspecto, possível
apenas nesse universo de composição simbólica. Nesse processo, alguns textos utilizam o
elemento fantástico para reforçar esse objetivo. De modo a evidenciar esse percurso, dois
contos que tocam essa problemática foram utilizados: As ruínas circulares, do escritor
argentino Jorge Luís Borges, e A terceira margem do rio, do brasileiro João Guimarães Rosa.
Este trabalho tem por objetivo suscitar a discussão sobre a presença do fantástico na obra de João Guimarães Rosa, com enfoque no conto “A menina de lá”, do livro Primeiras Estórias, publicado em 1962. Nesse intento, para a análise do comportamento da criança, o aporte teórico trata dos conceitos pertinentes à constelação conceitual do insólito na literatura, a partir do clássico Tzvetan Todorov, e se estende ao animismo e aos mitos, conforme Jean Piaget e Karl Kerényi.