Investigação da linguagem que em Orientação se encaminha para a mitopoesia. Interpretação dos chistes e expressões usadas por um narrador sempre disposto a embaraçar o leitor, ao mesmo tempo em que propõe indagações e lhe oferece pistas referentes à natureza dos mistérios, na vida do herói Yao Tsing-Lao, o Quim. Como orientadores da leitura, este ensaio recorre a Haroldo de Campos e a Francis Utéza. O estudo da escrita ideogramática, que Campos faz em ângulos diversos, auxiliará em nosso breve recorte pelo ângulo lógico-filosófico. Assim, as referências textuais sobre essa escrita serão vistas como instrumentos para a poesia. A recorrência a Utéza deve-se à busca de informações sobre a metafísica taoísta, para interpretar determinados substratos da linguagem conotativa e hermética, presentes no conto de Guimarães Rosa.
A partir da análise de imagens do filme Diários de motocicleta, de Walter Salles, são discutidos os sentidos da travessia do rio Amazonas pelo estudante Ernesto Guevara de La Serna, quando dialoga com as travessias da obra de Guimarães Rosa e, em especial, com o conto "Orientação", da coletânea Tutaméia. O rio Amazonas é nuclear para essas observações. Em torno dele, são enfocados ainda os romances A jangada, de Júlio Verne; o filme Fitzcarraldo (o preço de um sonho), de Herzog; e escritos de Euclides da Cunha. Um dos temas centrais de Guimarães Rosa, a travessia, serve de motivo para a discussão de papéis do intelectual e da integração latino-americana.
Em "Orientação", conto presente em Tutaméia (Terceiras Estórias), de João Guimarães Rosa, constata-se a presença da alteridade, ou melhor, o cruzamento de duas alteridades: o chinês Yao Tsing-Lao e a sertaneja Rita Rola. A paixão correspondida resulta no casamento entre Oriente e Ocidente. Embora o enlace não perdure, o encontro de personagens tão diferentes no que tange ao aspecto físico e comportamental acarreta transformações. Da convivência com o chinês, Rita Rola, gradativamente, torna-se diferente, orientaliza-se.
Starting off from images and movie song of Motorcycle Diaries, the Brazilian Walter Salles discusses the meaning of the practice of the then young medical student Ernesto Guevara de La Serna and Latin American perspective it raises. The Amazon River is central to these observations, as is the case with the novel The Raft (1881) by Jules Verne and The Stone Raft by José Saramago, published one hundred years later, in addition to Werner Herzog's film Fitscarraldo, the price of a dream. The river crossing is also featured as a theme in Guimarães Rosa's work and sets a discussion of the role of the intellectual, as well as the Atlantic crossings between the colonizer and the colonized. The crossings in theoretical and critical terms are problematized in terms of boundaries and identities. The prospects opened up by the short story "Orientation" (Tutaméia) by Guimarães Rosa, the novel by José Saramago and a symbolic crossing in the Angolan romance Pepetela (A generation of utopia), reverse the positivist outlook of modernity and evade being ossified by postmodernity. Such narratives spawn the discussion of historical, cultural and literary discourses of our times that naturalize the processes of networking and acceptance of asymmetrical cultural flows. In contrast to the habits of the managed society, leading to administration of difference in favor of established hegemonies, they develop the concept of concrete utopia, a youth principle, which is realized in the projects where supranational community horizons are key.
Este trabalho tem como objetivo investigar a figuração do 'estrangeiro' e suas relações com o habitante nativo nos contos de João Guimarães Rosa intitulados: "O cavalo que bebia cerveja", "Orientação", "Faraó e a água do rio", "O outro ou o outro" e "Zingaresca". Nossa empreitada centraliza-se no estudo das tensões vinculadas à prática da hospitalidade e/ou hostilidade exercida pelos personagens nativos, os 'anfitriões', sobre os personagens estrangeiros, os 'hóspedes' em questão. Investigar a possibilidade de existência de uma hospitalidade no sertão rosiano, e a complexidade de sentimentos e comportamentos envolvidos no contato entre nativo e sertanejo, também foram objetivos que perseguimos. Ainda nos detivemos no exame da assimilação do elemento estrangeiro pelo nativo, processo que gera e culmina em um enriquecimento pessoal proporcionado pelo convívio com as diferenças. Nossas percepções encontraram apoio em reflexões empreendidas por teóricos como Jacques Derrida (sobre a questão da hospitalidade e do estrangeiro), Edward Said (principalmente no que se refere à construção de imagens arbitrárias que costumam mediar nossas relações com a alteridade) e Hillis Miller (no que se refere à profunda relação entre hospitalidade e hostilidade).
Centro de Letras e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Letras.
Tutaméia (Terceiras Estórias), de João Guimarães Rosa, é uma obra que desestrutura o leitor. Os elementos que a tornam labiríntica são múltiplos: dois índices, dois títulos, ordenação alfabética dos contos, anagramas, epígrafes, glossário, quatro prefácios, ilustrações de capa e ilustrações ao final de cada estória. A tese que se propõe defender nesta pesquisa dá conta de decifrar parte de um de seus enigmas. Curiosamente, o livro possui quatro prefácios distribuídos de entremeio aos contos. A nosso ver, desempenhando função específica planejada pelo ficcionista, tais textos estariam a serviço de “prefaciar” os correspondentes contos que antecipam. Através da análise dos onze contos que seguem o terceiro prefácio, “Nós, os temulentos”, o presente estudo objetiva evidenciar esta intenção do escritor. Em “Nós, os temulentos”, Guimarães Rosa explora, pela via do humor, a visão “diplópica” de “Chico, o herói”, propiciada pela embriaguez. Por meio da imagem deste temulento e de seus dualismos, o autor parece oferecer a chave temática do grupo de estórias que segue o referido prefácio. Acreditamos que a grande constante ou a coluna dorsal de tais contos é o tema do duplo. O primeiro passo a ser dado para provar esta tese inicia já na introdução do trabalho. Nesta parte, são detalhados os pormenores da peculiar estrutura de Tutaméia (Terceiras Estórias) e tecidas algumas considerações acerca dos quatro prefácios que a compõem. Em seguida, conforme antecipa o título do primeiro capítulo, é realizado “um périplo pelo território do duplo”, assunto de abrangência bastante considerável. Por último, são realizadas as análises dos contos “O outro ou o outro”, “Orientação”, “Os três homens e o boi dos três homens que inventaram um boi”, “Palhaço da boca verde”, “Presepe”, “Quadrinho de estória”, “Rebimba, o bom”, “Retrato de cavalo”, “Ripuária”, “Se eu seria personagem” e “Sinhá secada”.
O presente trabalho analisa os contos Orientação, de Guimarães Rosa, e Um oriental na
vastidão, de Milton Hatoum. Esses textos são compreendidos como lugares onde aparecem
cartografados os encontros interculturais entre personagens chinesas, japonesas e brasileiras no
sertão mineiro e na floresta amazônica em projetados em escala global do imaginário
contemporâneo. Zona de passagem intricada, as vozes heterogêneas do texto rosiano e
hatouniano equilibram-se na desterritorialização do imaginário híbrido, imprimindo o ritmo da
travessia para o outro lado de si, além do deslocamento pela atmosfera das latências do outro,
reposicionada na constelação das mobilidades transmigrantes.
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