Neste artigo é feito um estudo do conto “A hora e a vez de Augusto Matraga”, de Guimarães Rosa, de modo a se observar como o trágico manifesta-se nessa obra e como ele pode representar um sinal de salvação para a personagem principal. Tal estudo está ancorado na concepção de trágico nietzschiana, segundo a qual a tragédia se constitui a partir da fusão de duas forças opostas, referentes aos espíritos de Apolo e Dioniso, representantes da aparência e da essência, respectivamente.
Há muitas linhas de análise da obra de João Guimarães Rosa. Uma que não tem sido proposta, a n ão ser em meu artigo sobre "Meu tio, o iauaretê" [o uso da língua tupi foi comentado por Haroldo de Campos e pela tradutora do conto para o espanhol, só por ocasião do III Encontro Guimarães Rosa], é a vertente do conhecimento indígena. Na medida em que em Grande sertão: veredas Riobaldo se preocupa em definir o diabo e o mal, para negar o mal e o diabo, existe pelo menos este sinal de uma busca correspondente à cosmogonia e uto pia indígenas: a busca da Terra sem Mal. Parto por um lado de registros de etnólogos sobre a busca da Terra sem Mal por indígenas tupiguarani, assim como de poemas e mitos colhidos entre esta e outras etnias, e, por outro lado, ancorada no desejo de Riobaldo de levar a todos que conhece para um lugar desconhecido por ele, um lugar sem Mal, assim como baseada em outras cenas do romance, apresentarei o paralelismo entre seu anseio de salvar, em primeiro lugar, seus companheiros, mas também seus conhecidos isto é, sua utopia e o mito indígena.
Leitura de aspectos da cultura popular, presentes no processo de construção ficcional de Guimarães Rosa, o “contista de contos críticos”, que confessara: "Não preciso inventar contos, eles vêm até mim”. Pela alquimia da palavra em seu estado primitivo, a fusão do real e ficcional com o obsessiva defesa de que "a legítima literatura deve ser vida". A multiplicação do imaginário rural mineiro na narrativa rosiana, especificamente, em contos de Tutaméia e Ave, Palavra. Historia e estória no cotidiano do povo do sertão mineiro. Pelo jogo da memória narrativa popular, a construção da identidade cultural sertaneja e a recriação do mito: "No sertão, o homem é o eu que ainda não encontrou o tu: por isso ali os anjos ou o diabo ainda manuseiam a língua".
Bastante conhecida por seu olhar míope (mas poucas vezes em baçado!), a personagem Miguilim, de "Campo geral", apreende o mundo sobretudo através de seu corpo, isto é, da visão das pequenas coisas, de cheiros, toques e sons. Em nossa leitura da novela, examina remos o fluxo dessa experiência sensória em sua relação com o próprio corpo da linguagem rosiana. Nesse caso, será analisada outra característica fundamental de Miguilim: a sua atividade como contador de estórias. Esta, além de criar sentidos para as percepções sensoriais da personagem, vai se constituindo como um modo de enfrentar os reveses de uma infância ma rcada por dúvidas intensas, pelo medo e pela morte.
O TEMA do centro é trabalhado simbolicamente em Grande sertão: veredas. Ele é construído mediante uma série de recursos discursivos e narrativos, tem fontes as mais diferentes e engloba diversos sentidos, inclusive por conter os elementos básicos de que é feito o mundo, segundo os antigos. Diversos sentidos e seus recursos são apresentados neste artigo. A pedra de toque é dada pela positividade. É que dentre tantas leituras de Guimarães Rosa, e no momento em que a tendência é a de ler o grande romance como reflexo da história, vale a pena ressaltar que a sua marca fundamental é a esperança na mudança, na reviravolta, no resgate, na vida enquanto conditio sine qua non da travessia. Positividade que não exclui o negativo - positividade includente.
Mestrado em Linguística Aplicada; Literatura Comparada
O presente trabalho tem como objetivo comparar a filosofia de Friedrich Nietzsche (1844-1900) e o conto de João Guimarães Rosa (1908-1967), A hora e vez de Augusto Matraga (1946), no intuito de revelar a possibilidade da aplicação da filosofia nieztscheana para expandir o valor estético do conto e possibilitar a compreensão do protagonista, Augusto Matraga, como o protótipo do ser superior nobre descrito por Nietzsche, o ubermensch. Considerando os conceitos do filósofo sobre a vontade de potência, os elementos dionisíaco e apolíneo, bem como o ideal ascético, pretende-se estabelecer até que ponto o protagonista pode ser concebido como um bom asceta, na medida em que, devido a sua natureza ontológica nobre, transgride a moral cristã e se aproxima do conceito do homem que está além do bem e do mal. Além da filosofia de Nietzsche, usar-se-á alguns postulados filosóficos de Martin Heidegger (1889-1976) para reforçar a idéia de que o juízo criado sobre Matraga é apenas uma aparência que não contempla a essência do seu Ser, contribuindo para camuflar seu caráter trágico-ontológico, o que implica na diminuição da força estética do conto.
Esta tese realiza um estudo na obra de Guimarães Rosa, detendo-se, especificamente sobre três contos no livro Sagarana, que são: São Marcos, A hora e vez de Augusto Matraga e Conversa de bois. Seu objetivo toma como categoria específica de análise, o herói, orientando-se segundo duas abordagens. A primeira tem como fundamento o reconhecimento de uma estrutura formal que sustenta as narrativas populares como matriz textual dos contos selecionados. A figura do herói, animada pela série luta-provação-superação, advinda do universo popular, evidencia o mito como ideia especulativa e filosófica sobre a existência. Na base temática da unidade formal de nossos contos identificamos as variantes da sátira menipeia, que remontam diretamente ao folclore carnavalesco (o tempo coletivo que torna possível a vizinhança das coisas e dos fenômenos de onde nós saímos e para onde voltaremos). A particularidade mais relevante do gênero da menipeia que capturamos em nosso recorte é a criação de situações extraordinárias pelos jogos de oximoros, com o intuito de provocar a experimentação de uma ideia filosófica. O caráter temático dos contos de tipo carnavalesco está por sua vez vinculado estreitamente ao sistema histórico-cultural da vida comum do sertanejo. Assim, a segunda abordagem pretende seguir a lógica cultural e simbólica da estrutura sócio-histórica representada, propiciando um trajeto investigativo que vai do imaginário de um grupo bem definido (crenças, código de honra e vingança) às relações sociais e vice-versa. Nosso percurso analítico em torno da obra Sagarana toma como ideia crítica fundamental a noção de que a arte rosiana desencadeia uma reflexividade em que múltiplas correspondências podem surgir a partir de uma constelação de elementos aparentemente díspares. Nos contos selecionados, dedicamo-nos a estudar como os acontecimentos morais e históricos da vida do sertanejo, constituindo a sua visão de mundo, cruzam-se com o caráter cíclico (tempo mítico) que a obra assume interessadamente, realizando a sua unidade artística.
Guimarães Rosa privilegia, em toda sua obra, lugares de ver e dizer o mundo historicamente desvalorizados no mundo ocidental. Parece-me que este gesto está em sintonia com a crise do paradigma civilização e barbárie, crise esta que problematiza uma série de oposições, como adulto-criança, oral-escrito, civilizado-selvagem, urbano-rústico. Estas oposições negavam, ao pólo considerado negativo ou inferior da dicotomia, uma forma de pensamento, de entendimento do mundo, que tivesse interesse, desqualificando-a. Rosa, procedendo o contrário, empenhando-se em construir mundos ficionais a partir desses marginalizados modos de ver e dizer, subverte o paradigma civilização e barbárie. Apresentarei, nesta comunicação, uma reflexão sobre as implicações deste gesto, inscrevendo a obra de Rosa num contexto mais amplo de crise e revisão das bases do pensamento ocidental. Nessa direção, apresentarei alguns pontos de contato entre o gesto rosiano e o de pensadores da chamada Escola de Frankfurt, empe
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