Investiga-se como narradores e personagens de três contos de Primeiras estórias (“O espelho”, “Pirlimpsiquice” e “Darandina”), de João Guimarães Rosa, utilizam a cultura clássica. O corpus examinado aponta para duas formas distintas: uma subserviente, quiçá rígida, e o mais das vezes explícita, geralmente indicativa de uma postura política e moral conservadora, outra, mais livre e solta e muitas vezes implícita.
Este estudo é parte de um trabalho de maior fôlego que se preocupa com o processo de criação literária de Guimarães Rosa. A leitura de manuscritos provenientes do arquivo do autor, que se encontra no IEB/USP, iluminou caminhos de leitura que apontaram o escritor montes-clarense Hermes de Paula como parte do material genético que deu vida e substância a pelo menos duas obras de Rosa: Tutaméia e Estas Estórias.
Pretende-se cotejar o conto “O Alienista”, de Machado de Assis, inserido em Papéis avulsos (1882), com o conto “Darandina”, de Guimarães Rosa, publicado em Primeiras estórias (1962). Ambos abordam, de modos distintos e contundentes, as relações entre o poder e o discurso psiquiátrico. Considera-se, ainda, que Guimarães Rosa tenha dialogado explicitamente com o texto machadiano, assim como fez em sua réplica homônima ao conto “O espelho”, também de Machado.
O trabalho realiza um percurso comparativo por três contos que têm figuras de loucos em seu centro – “Darandina” e “Sorôco, sua mãe, sua filha”, de Guimarães Rosa, e “O alienista”, de Machado de Assis –, discutindo as formas que a loucura assume neles e suas relações com a idéia e as demandas de uma certa coletividade, sobretudo a dupla e instável necessidade de romper e manter os limites identitários da dita “normalidade”.
As estórias de Guimarães Rosa encerram um projeto poético-existencial que se dá a conhecer na estória “O espelho”, centro cordial do livro Primeiras estórias. Ali propõe-se a vida como um exercício contínuo de criatividade, do qual depende a proclamação de uma autonomia e a gênese de um si próprio, que se inaugura para a existência como autor do seu próprio devir. Apresentando inicialmente a estória rosiana e a plêiade de conceitos poéticos que ela engendra e promove, bem como a operação crítico-passional que a sua leitura requer, o presente trabalho toma a si a tarefa de interpretar duas estórias, uma de Primeiras estórias e outra de Tutameia. Terceiras estórias – “Darandina” e “- Uai, eu? ”respectivamente – mostrando o projeto rosiano em ação em duas situações radicalmente distintas, que, no entanto, guardam semelhanças suficientes, não só para realçar e dar concretude à ideia primordial da qual promanam, mas também para deixar transparecer um consórcio entre primeiras e terceiras estórias, irmanadas no que se poderia denominar o magistério rosiano do existir.
Esta pesquisa teve por objetivo refletir sobre variadas formas de abordagem do tema da loucura na literatura ficcional e na científica. Para tanto, foram consultados escritores que apresentaram em suas obras registros da demência, tratada segundo as concepções das diferentes épocas e dos contextos sociais e culturais em que se inseriam. Buscaram-se exemplares da literatura em que diversos critérios nortearam os diagnósticos de loucura, bem como o tratamento realizado. Considerando-se o papel da ficção ao apresentar a realidade temática, Machado de Assis, com o conto O Alienista, Guimarães Rosa com os contos “Sorôco, sua mãe e sua filha” e “Darandina” e Erasmo de Rotterdam com a obra: O Elogio da Loucura, que constituíram-se como rica fonte de reflexão e análise. Numa proposta interdisciplinar, foram solicitados para a fundamentação teórico-literária Alfredo Bosi, Antônio Candido, Affonso Romano Sant‟Anna, Bastos e Mikhail Bakhtin. Da literatura científica, buscaram-se as contribuições de Foucault, Amarante, Jung, Freud, Miranda e Canguilhem, Goffman e outros que trataram do tema da loucura, nas mais diversas nuances, dando consistência às percepções decorrentes deste estudo.
Faculdade de Letras, Departamento de Letras Vernáculas
Esta Dissertação desenvolve um estudo sobre a correlação do mítico, do simbólico e do imaginário na constituição da narrativa de Primeiras estórias, de João Guimarães Rosa, tomando por base os contos Pirlimpsiquice, O Espelho, Darandina, A Terceira Margem do Rio, As Margens da Alegria e Os Cimos. Estabelece-se nela a arte como manifestação do real. Defende-se a idéia de que Primeiras estórias possui um princípio interpretativo inerente a estrutura da obra. As reflexões giram em torno das conceituações sobre a consagração do tempo e do espaço, iniciação, imanência, transcendência e transdescendência, Homo Viator (Religiosus/Trans/humano), personagente, psiquiartista, elementos apresentados de modo original na obra de Guimarães Rosa. A palavra chave deste trabalho é travessia, sinônimo de metamorfose, de conversão, mostrando que, por isso, a narrativa está em metamorfose constante, convertendo em símbolo todos os seus elementos. Mostra, ainda, que a força mágica do narrar é o agente ficcional de coesão no qual o mítico e o simbólico se integram na invenção rosiana da realidade. A verdade poética de Primeiras estórias é uma manifestação mítica, simbólica e imaginária. O real é a interação dialética desses três pontos que convergem e convertem o narrar rosiano em narrativa mitopoética: ela não imita a realidade, mas manifesta-a. A mímesis não é imitação, mas concriatividade do mítico, do simbólico e do imginário na constituição do real.
Na obra de João Guimarães Rosa, a loucura não é apenas um tema recorrente. Os loucos apresentam-se intimamente relacionados à poética do autor, são detentores de sabedorias que superam o campo estritamente racional, são seres ligados ao mundo profético, à poesia, à criança e a todos os elementos que simbolizam o homem criativo. A partir de uma das sagas de Corpo de baile e de algumas das estórias que compõem a obra Primeiras estórias, este trabalho propõe um estudo de personagens que vivem à margem da razão, de modo a entender a singularidade do desatino rosiano.
Este trabalho centra-se no estudo das narrativas “Campo geral”, de Corpo de baile (1956), “As margens da alegria”, “Os cimos” e “Darandina”, de Primeiras estórias (1962), do escritor João Guimarães Rosa (1908-1967). Será discutido a perspectiva da criança e do louco a respeito do modo de apreensão do mundo e da vida, seja pela beleza, seja pela loucura, visando também a uma leitura comparativa relacionada à temporalidade em “As margens da alegria” e em “Os cimos”, cuja semelhança está presente tanto na temática quanto na estrutura das narrativas. Com o intuito de interpretar os contos selecionados, em que são abordados temas diversificados como: a infância, a alegria, a perda, a morte, a loucura e o sofrimento foram escolhidos estudiosos das obras de Guimarães Rosa como: Paulo Rónai, Claudia Soares, Sílvio Holanda, Luiz Tatit. Tendo em vista que este exame se fundamenta na Estética da Recepção, formulada por Hans Robert Jauss, o qual, sob a ótica de uma hermenêutica literária, defende que o leitor é o principal colaborador na constituição de sentido de uma dada produção literária, em que a experiência estética é conduzida por uma integração entre a herança da tradição histórico-literária e os horizontes interpretativos de quem lê a obra. Dessa forma, no primeiro capítulo, discutiremos acerca do método estético-recepcional e da hermenêutica literária, balizados por textos de Jauss, Gadamer, Ricoeur e Palmer, traçando as orientações teóricas para a construção dos próximos capítulos. No segundo capítulo, proporemos o estudo da interpretação de “As margens da alegria”, “Os cimos” e “Darandina” (Primeiras estórias) e de “Campo geral” (Corpo de baile). Por último, no terceiro capítulo, faremos a análise da recepção crítica das narrativas supracitadas.
Esta comunicação possui como objeto de análise a narrativa “Darandina”, do livro Primeiro Estórias (1962), de João Guimarães Rosa, levando-se em conta aspectos temático-estruturais e o modo de apreensão do mundo e da vida, por meio da loucura. “Darandina” é uma narrativa que relata a história de um sujeito que rouba uma caneta e é surpreendido quando escala uma palmeira, resistindo a qualquer tentativa de ser retirado de lá, há uma irrupção de loucura por parte do sujeito que, no topo da palmeira, inicia um discurso filosófico. Portanto, o discurso do personagem principal revela-nos uma expressiva desconstrução da razão por meio da desconstrução da linguagem. Tendo em vista que os recursos literários metafóricos são evidências fortes, que estudadas pela ótica da psicanálise estimula à reflexão sobre a verdade evidente versus verdade representada. Ao que parece, segundo Eduardo Coutinho (1994), Guimarães Rosa executa verdadeira desconstrução do discurso hegemônico da lógica ocidental, lançando-se na busca de terceiras possibilidades.
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