Última narrativa de uma sequência de sete novelas de Corpo de Baile, “Buriti”
encerra o ciclo rosiano, resgatando no protagonista Miguel o menino Miguilim, de “Campo
Geral”. O que motivaria Guimarães Rosa a empreender a travessia das sete narrativas,
quando decide abrir e fechar o conjunto Corpo de Baile com o mesmo herói? Na tentativa de
responder ao mistério da personagem principal, o presente trabalho detecta na ocorrência do
léxico erro em ambas as histórias um índice hermenêutico: se, quando criança, Miguilim omite
o bilhete do Tio à Mãe; adulto, Miguel se cala ao conhecer Maria da Glória, como salienta Luiz
Costa Lima: “A fala que se trocam é a fala das reticências, da palavra pouco explicitada”.
Segundo a tradição hesiódica, o deus Eros “doma no peito o espírito e a prudente vontade”.
Solidária à angústia amorosa, outra personagem feminina é convocada - Leandra. Sob o
patrocínio da virilidade na etimologia do nome, a estrangeira acusará a obsolescência de um
patriarcado que exige fertilização. Será Diotima, a sacerdotisa que legou a Sócrates a função
e o sentido de Eros, quem mais se fará presente nas reflexões de Leandra. Na medida em
que atualiza o diálogo platônico, O Banquete, Guimarães Rosa reverte o erro de MiguilimMiguel:de
uma inicial hýbris à cara noção de eudaimonia. Porém, mais do que desfazer um
conflito outrora trágico, o autor esboça em “Buriti” uma teoria da vontade humana solidária à
divindade que preside o desejo erótico.
Este artigo analisa o processo de composição de uma canção popular, descrito no conto “O recado do morro”, de Guimarães Rosa. A narrativa relata uma experiência de inspiração poética originária de uma mensagem de natureza profética. Para que o alerta da profecia chegasse ao seu destinatário, fora preciso uma sequência de codificação e recodificação da mensagem de um morro. Consideramos essa cadeia como um fluxo afetivo e efetivo, tal como descrito nos relatos dos bardos homéricos.
O que Cara de Bronze, personagem homônima que dá título ao conto, ou mais precisamente, Grivo, o vaqueiro narrador, teria a dizer de único ou singular, para que Guimarães Rosa operasse o deslocamento da sequencial inicial do conjunto Corpo de Baile? Para além da composição formal, ora em prosa, ora em diálogo, as referências bibliográficas, incluídas pelo próprio autor como partes integrantes do conto, por si só indicam um caminho a seguir. O presente trabalho se propõe a traçar o eco da cultura helenística na obra rosiana, baseado na noção de sintoma, do historiador da arte do Renascimento, Aby Warbur.
O desejo sexual de um jagunço por uma prostituta é razão suficiente para um pedido de casamento. Passados três anos de matrimônio no religioso e no civil, o relacionamento do matador com a meretriz sofre abalo quando do reencontro de um velho amigo e um tropeiro que o acompanha. Aparentemente ciumento, a insegurança de Soropita camufla uma vaidade. O presente artigo procura demonstrar em que medida o desdobramento do relacionamento de Soropita com Doralda dialoga com as três acepções de amor que o léxico grego comporta: Eros, Filía e Ágape, segundo os filósofos contemporâneos André Comte-Sponville e Paul Ricoeur.
"Uma estória de amor" expõe as fraturas de um homem s. Embora acompanhado da família e dos empregados da fazenda que administra, Manuelzão sente a dor da solidão. A noção de contemporaneidade de Agambem nos ajuda a compreender a íntima revisão operada pelo protagonista.
O trabalho A noção de erro em Corpo de Baile, de Guimarães Rosa: uma estratégia poética visa destacar as passagens nas quais o léxico erro aparece em Corpo de Baile, de Guimarães Rosa, compreendendo o vocábulo enquanto escolha intuitiva do autor para construção e tratamento epistemológico dado às trajetórias de seus herois. Baseado na teoria de juízo de eliminação da dúvida, o trabalho tenta compreender de que forma o flagrante do erro imputa aos herois do ciclo a responsabilidade sob seus atos. A dissertação faz uma leitura a contrapelo do erro trágico, defendendo que a percepção de um engano e as questões éticas que dele decorrem constituem o argumento rosiano de Corpo de Baile. A pesquisa procurou compreender de que forma a escolha pelo léxico erro responde à necessidade dos herois rosianos refutarem a si próprios, amparados pela emoção, e não exclusivamente pela razão. A pesquisa detectou que, para traçar esse movimento rotação, os herois de Corpo de Baile operam transposições: da dúvida à decisão; da decisão à esperança. Do flagrante do próprio erro, cada protagonista, primeiramente, se mantém no melindre da decisão; suficientemente munido de confiança, opta por um ou outro caminho. Circunscrevendo nas sete narrativas o princípio de autorreparação, a pesquisa ata a trama do erro num movimento de translação em torno do tema. O trabalho conclui que os protagonistas, submetidos à eliminação de uma dúvida interna, conseguem rever a si próprios e despertar no leitor uma motivação.