Este ensaio tem como objetivo refletir sobre a narrativa “A benfazeja”, de João Guimarães Rosa, colocando-se como ponto de convergência entre a personagem Mula-Marmela e as manifestações trágicas no Sertão, colocando-se como “aclimatação” a partir de diversos elementos, como o destino, a desmesura e a catarse. “A benfazeja” dialoga com a universal dimensão humana presente nos dramas gregos, sobretudo no que tange às escolhas e à relação com a comunidade, em um movimento que redimensiona as “estórias” gregas no cotidiano sertanejo.
Neste artigo examina-se a narrativa “A Benfazeja”, do livro Primeiras estórias, de João Guimarães Rosa investigando a sua contribuição para ilustrar aspectos pouco investigados acerca do conceito de cordialidade presente em Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda. Soma-se a essa análise uma leitura acerca das relações de poder elaboradas na narrativa que permitem verificar uma ruptura com a representação dos ideais da família patriarcal engendrada pelo soterramento do modelo ideal, banimento do poder masculino e descaracterização do papel idealizado da mulher. Nota-se, por fim, como a negação da subjetividade feminina, por parte do patriarcado, está ainda presente na estrutura social brasileira e tem alimentado comportamentos misóginos. Por tais razões considera-se que a narrativa consiste em metáfora das relações de poder entre democracia e patriarcado estabelecidas ainda hoje na sociedade e na democracia brasileira.