Este artigo tem por objetivo discutir determinadas alterações empreendidas em cenas de Primeiras estórias, de João Guimarães Rosa, no processo de adaptação dessa obra para o texto fílmico Outras estórias, de Pedro Bial. Para tanto, discute-se a natureza da mudança de suporte, na esteira dos estudos de base greimasiana, observando certas construções de sentido que se recriam nesse processo de transcodificação. Utiliza-se, desse modo, a noção de adaptação enquanto forma de tradução/transcodificação, isto é, uma interpretação que se realiza como enunciado segundo que deve manter certa equivalência em relação ao enunciado primeiro. O texto aponta também para as noções de recursividade e desdobramento, formas de uma tipologia textual que podem dar conta das alterações da expressão na passagem do texto verbal rosiano ao audiovisual de Pedro Bial. Por fim, pretende-se ainda apontar certos encadeamentos figurativos e temáticos que se organizam nos dois textos e que permitem a percepção da supressão do estado de aparente loucura de Liojorge no filme, o qual é enunciado no texto verbal, e, por sua vez, a reiteração do estado de coragem do ator, já presente no texto rosiano, em cenas do texto fílmico.
Os estudos sobre a expressividade da língua vêm desde a Grécia e a Roma antigas, mas apenas no século XX foram apresentados como uma disciplina por Bally, sob a denominação de Estilística. Nesta pesquisa, damos enfoque ao âmbito dessa ciência que estuda os sons e, tendo como base teórica Monteiro (2006) e Martins (1997), objetivamos analisá-los como um recurso empregado na nomeação dos personagens do autor modernista Guimarães Rosa, a partir da análise do potencial expressivo dos fonemas. O corpus utilizado é composto por dezessete contos, os quais estão reunidos na obra Primeiras estórias, do autor referido. Com o intuito de observar se Guimarães Rosa utiliza a Fonoestilística como um recurso na nomeação dos personagens, os contos analisados são apenas aqueles em que os personagens apresentam nomes próprios. Por meio da análise realizada, foi possível constatar a relação direta entre as características dos personagens e a expressividade oriunda dos fonemas que formam os seus antropônimos, levando-nos à conclusão de que Rosa utiliza-se de aspectos fonoestilísticos na realização do processo de denominação, de modo a apresentar a caracterização dos seus personagens por meio dos seus nomes.
Os debates sobre a apropriação que o cinema faz de obras literárias não são recentes, tampouco podem ser considerados como um caso superado ou resolvido. A partir disso, o presente trabalho consiste na análise da transposição de alguns elementos da narrativa literária de cinco contos da obra Primeiras estórias (1962), de João Guimarães Rosa, para a narrativa fílmica Outras estórias (1999), dirigida por Pedro Bial, considerando-se, principalmente, a caracterização dos personagens; a estruturação, o aproveitamento e entrecruzamento dos enredos; além das presenças das vozes narrativas. Como resultado de tal análise, pretende-se demonstrar como a tensão dos diversos dramas humanos foi transposta para os elementos essencialmente cinematográficos, para os quais colaboram a narrativa pela imagem, a fotografia, os planos e o enquadramento, entre outros, bem como os apontamentos dos recursos que Bial utilizou para recriar em linguagem cinematográfica o universo rosiano.
É possível falar de um exotismo essencial na obra de João Guimarães Rosa ou, ao menos, que ela possui peculiaridades de uma humanidade local frente aos olhos de um citadino letrado? Se, por um lado, tal leitura é possível e legítima, por outro, não estaríamos correndo o risco de cair em um reducionismo demasiadamente simplista? Não seria melhor pensarmos que a verve desse autor, a idiossincrasia de seus personagens, sua linguagem e seu universo ocultam questões fundamentais capazes de suscitar reflexões que podem subverter as condições impostas pela realidade vigente? Tal é a hipótese que guiará nossa investigação. Buscaremos reconhecer o caráter exemplar dessa obra frente ao controle exercido por uma racionalidade soberana e soberba, inserindo-a no rol da modernidade artística.
Consoante com a concepção rosiana do novo gênero literário ao qual Guimarães Rosa nomeou ‘estória’, este artigo investiga aspectos da tradução de três estórias de Primeiras estórias para o inglês, sob a perspectiva das abordagens sistêmicas da tradução – baseadas na lingüística sistêmico-funcional de M.A.K. Halliday (1994) – focalizando, para tal fim, a organização temática dos textos. O sistema de Tema, segundo a gramática sistêmico-funcional, relaciona-se com a organização da informação em cada oração individualmente e, através delas, com a organização do texto como um todo. Assim, as escolhas temáticas e sua articulação ao longo do texto fornecem dados sobre as diferentes estruturas discursivas desenvolvidas por autores e tradutores, as quais são peças fundamentais nas diversas representações construídas nos textos, que alcançam desde o nível oracional até a configuração textual do gênero. A partir da identificação e classificação dos Temas, os dados foram
analisados sistemicamente para reconhecimento de padrões de organização temática predominantes e interpretação das mudanças decorrentes do processo tradutório nesta organização. Os resultados
apontam para uma configuração textual diferenciada nos contos traduzidos, indicando o gênero no qual a obra está inserida no contexto de língua inglesa – o conto (short story), e não a estória –
como sua principal motivação textual.
Este artigo enfoca um episódio de Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa, no qual o protagonista Riobaldo, então denominado Urutu-Branco, encontra um leproso e sofre a tentação de matá-lo afim de, como ele próprio afirma, "emendar o defeituoso". Esse episódio é exemplar quanto à tematização da culpa relacionada ao corpo; sua análise possibilita inserir esse tema na questão central de Grande sertão: veredas, a da existência (ou não) de Deus e do Diabo.
Análise literária examina o desenho/ilustração apenas enquanto metalinguagem. Aqui, o conto "As Margens da Alegria" e o livro Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa, são examinados numa perspectiva em que o desenho/ilustração é a expressão de uma escrita da visualidade que se manifesta, nos textos de Rosa, pelas paisagens literárias desenhadas por palavras, e, em seus livros, nas ilustrações características das primeiras edições. Esta perspectiva instiga a análise da obra rosiana pela relação entre seus textos e seus livros.
As Primeiras estórias como atos genesíacos primordiais. O princípio do uno e do múltiplo
regendo a proliferação das estórias. Os quatro pilares fundamentais que sustentam a estrutura arquitetônica do livro: a catábase, o personagente, o psiquiartista e a alegria. O entrelaçamento destas noções e o seu desdobramento nas estórias. A estória medial – “O espelho” – e as duas estórias extremas – “As margens da alegria” e “Os cimos” – como o princípio ativo do livro a partir do qual as outras dezoito estórias seguem-se umas às outras num percurso progressivo de desvelamento e engrandecimento do homem. A seqüência das estórias e a sua orquestração conjunta na composição de um enredo harmônico. As correlações internas entre as estórias. O destino ascensional da alma e os ecos plotinianos na obra
rosiana.
O longa metragem Outras estórias, de Pedro Bial, é uma leitura- montagem de cinco dos contos de Primeiras estórias que o escritor mineiro publicou em 1962; todavia, não se trata de transposição de uma obra literária para o cinema, mas, antes, de uma concepção dela enquanto possibilidade cinematográfica. À maneira de Rosa, Bial pes- quisa um ?dialeto? cinematográfico, uma sintaxe que se corporifica num compósito que inclui cinema, teatro e literatura, onde ficam mobilizados a oralidade e a escrita, a imagem visual e a metáfora, os planos e a mon- tagem, os recortes e os movimentos, os sons, as imagens e os sentidos.
Apesar de alguns contos das Primeiras estórias terem sido escritos em momentos diferentes, a moldura que os enfeixa e os torna coerentes leva a olhá-los e a interpretá-los numa perspectiva eminentemente histórica, conectando o livro que os contém ao seu presente. O meu ensaio tenta, justamente, mostrar como Guimarães Rosa leia a sua contemporaneidade a partir dum anacronismo: duma “arqueologia” que se apresenta enquanto sistema hermenêutico duma época marcada pela exaltação do progresso. A fundação duma nova Pátria, simbolizada e depois concretizada na fundação duma nova Capital, leva, nesse sentido, o escritor a interrogar ainda – e como sempre – um passado recalcado para compreender o presente, sublimando ou revelando em palimpsesto a sua ideia duma comunidade “excogitada das camadas angustiosas do olvido”.
A primeira publicação de João Guimarães Rosa após o romanceGrande Sertão: Veredas (1956) veio alguns anos depois, com Primeiras Estórias (1962),contendo vinte e um contos por vezes considerados representativos da dita terceira fase do Modernismo brasileiro.O título indica a intenção de uma retomada de curtas narrativas da forma do conto, além da antiga grafia “estória”, que designa o propriamente fictício, ao invés da palavra “história”, como no vocabulário do inglês ainda sobrevive a diferença story/history.
A presente comunicação é um estudo interpretativo do volume Primeiras Estórias, publicado em 1962 por Guimarães Rosa, examina-se a recepção de temas trágicos pela narrativa rosiana, tais como a ideia de fatalidade e de destino. Fazem-se confrontos entre os contos de 1962 e a tradição da tragédia grega, sobretudo daquela vertente que remonta a Sófocles e a Ésquilo.
O presente artigo tem como objetivo retraçar a recepção de Primeiras Estórias (1962), de João Guimarães Rosa, em tradução francesa publicada em 1982, pela Editora Anne Marie Métailié. O artigo parte da introdução da obra na França feita por Paulo Rónai na revista universitária Caravelle, em 1965, para então analisar a obra romanesca e novelística de Rosa, desvelando os aspectos mais notáveis dos principais contos de Primeiras Estórias tanto do ponto de vista formal (inovador e pioneiro) quanto do ponto de vista diegético. A recepção francesa desse conjunto novelístico passou por várias fases das quais a primeira concerne a própria tradução em francês. Assim, apesar da excelente avaliação da qual foi alvo da parte de tradutólogos como Antoine Berman e Henri Meschonnic, o texto em francês, no qual a tradutora se esforçou para manter o teor linguístico inovador de Rosa, encontrou certas resistências inclusive da própria editora que permitiu que « correções » fossem aplicadas em versões posteriores. Passado esse primeiro momento de questionamentos formais,, novas leituras, a partir de 2012, surgem na França em que a hermenêutica prevalece sobre a linguística ou a tradutologia.
Palavras-chave: Guimarães Rosa. Primeiras Estórias. Inovação literária. Tradução.Recepção.