O trabalho consiste num depoimento do autor-tradutor alemão de Guimarães Rosa - que, utilizando-se de trechos de sua correspondência com o escritor, reflete sobre o processo de escrita da obra rosiana e sobre a concepção de tradução como uma "irmã gêmea da criação", como uma atividade de "transplantação homológica" da "cosmovisão" construída pelo autor, no texto original.
O artigo analisa a correspondência entre João Guimarães Rosa e seu primeiro tradutor alemão, Curt Meyer-Clason, destacando trechos que exponham a concepção de tradução e linguagem dos dois missivistas. Ao longo da análise, o texto dialoga com reflexões sobre tradução de Walter Benjamin, Haroldo de Campos, Antoine Berman e Márcio Seligmann-Silva. Por fim, há um breve comentário sobre algumas soluções de Meyer-Clason, em alemão, para a ficção de Rosa, desde exemplos lexicais até um trecho já em forma de parágrafo.
Palavras-chave: Carta. Tradução. Alemão. Guimarães Rosa. Curt Meyer-Clason.
O presente artigo organiza-se em torno de dois eixos principais. Trata-se, no primeiro, da rápida discussão de aspectos relativos ao estudo de documentos epistolares como fonte de pesquisa e da apresentação do caso dacorrespondência trocada entre João Guimarães Rosa e seu tradutor alemão Curt Meyer-Clason. Na sequência são apresentados elementos que, combase na análise de documentos publicados e de documentos inéditos, levam à consideração aspectos da obra e do fazer poético do autor ainda não ponderados publicamente pela crítica especializada.
Buscando problematizar a separação histórica entre língua e literatura na esfera educacional, faremos neste trabalho reflexões a partir do fio condutor da tradução interlingual como possibilidade de superação dessa dicotomia. Argumentamos que a naturalização da cisão entre língua e literatura tem sedimentado processos educacionais comprometidos com o tecnicismo e, assim, subtraído da pedagogia de língua adicional sua dimensão humanista, através da ênfase exclusiva na cognição e no texto como materialidade referencial. Nesse cenário, a tradução de textos literários e referenciais entre línguas distintas se apresenta como espaço de confluência de práticas que solicitam das tradutoras i. a ruptura com o representacionismo na concepção de língua/linguagem; ii. a ressignificação da língua em face das potencialidades linguísticas que o texto literário inscreve ; iii. a constante reformulação e expansão do repertório de estratégias tradutórias e iv. a assunção de seu papel como agente/interventora na produção e circulação de textos.
A correspondência entre Curt Meyer-Clason, um dos tradutores de literatura brasileira em língua alemã mais premiados em nosso país, e João Guimarães Rosa lança luz sobre os aspectos do ofício e da missão do tradutor, no qual “cada palavra está por fio”. Nessa convivência intensa debatem-se as possibilidades e impossibilidades da tradução, sempre com muita paixão pela arte literária e zelo pelo leitor.
No caso de textos ficcionais que encenam a perspetiva narrativa através de falas regionalmente específicas, o tradutor literário está confrontado com dificuldades quase insuperáveis. A oralidade que se constrói no contínuo de diálogo (unilateral) e fluxo de consciência constitui mais do que um problema de reprodução. A questão central é a perspetiva narrativa e as propostas de identificação dirigidas ao leitor implícito. No texto-alvo, isto se torna um desafio peculiar, não só para outra língua mas também para outro leitor, no caso de a constelação linguística binária ficar atravessada por uma terceira língua. É o caso da situação linguística híbrida na narrativa Meu tio o Iauaretê (1961) de João Guimarães Rosatraduzida para alemão por Curt Meyer-Clason em Mein Onkel der Jaguar (1981). A nossa abordagem parte da categoria da fala de proximidade (Ágel & Hennig), tendo também em conta o processo autoreflexivo do tradutor que se manifesta no pósfácio e no glossário.
Este trabalho examina a correspondência entre Guimarães Rosa e seus tradutores alemão, italiano e norte-americana, com vistas à depreensão e análise de perspectivas rosianas sobre o simbolismo sonoro. Examinam-se as reflexões sobre o tema que se podem depreender (a) das considerações gerais que Rosa faz no corpo das cartas enviadas a seus tradutores; e (b) das detalhadas instruções que ele acrescenta em anexos, para dirimir dúvidas específicas colocadas pelos tradutores. Mostra-se, pela análise das epístolas, que a criação linguística rosiana tende a abarcar de forma deliberada e até certo ponto calculada a sonoridade sugestiva, por meio de singulares onomatopeias, aliterações, assonâncias e padrões rítmicos, resultando em um simbolismo sonoro. Conferindo carga expressiva, força e plasticidade ao texto, o simbolismo sonoro é um importante aliado nas estratégias rosianas de privar o leitor da ?bengala dos lugares comuns? (carta a Harriet de Onis) e de convidá-lo a ter com a língua uma relação que não seja unicamente ?lógico-reflexiva? (Carta a Edoardo Bizzarri). Mostra-se ainda que, no que tange às formas como dialogam com as teorias linguísticas, as reflexões e atitudes tradutórias de Rosa, tendendo à recusa do princípio da arbitrariedade do signo, apresentam convergências parciais com discursos teóricos que sustentam o simbolismo sonoro, em especial os de Jespersen e Jakobson.
Esta dissertação é um estudo da correspondência de Guimarães Rosa com seus tradutores - Curt Meyer-Clason, Edoardo Bizzarri e Harriet de Onís, que verteram suas obras respectivamente para o alemão, o italiano e o inglês - buscando inicialmente destacar nas cartas as peculiaridades específicas do discurso epistolar, para investigar em seguida aspectos da vida e obra do escritor. Tal investigação privilegia a análise e interpretação dos enunciados das cartas com o objetivo de mostrar a manifestação e encenação da subjetividade do escritor, e os conceitos estéticos que elabora e explica aos seus tradutores, explorando as aproximações e tensões sob as quais essa subjetividade do escritor, e os conceitos estéticos que elabora e explica aos seus tradutores, explorando as aproximações e tensões sob as quais essa subjetividade e essa estética se organizam e se relacionam.
Este trabalho de dissertação de mestrado objetivou estabelecer uma edição fidedigna e anotada da Correspondência inédita entre João Guimarães Rosa e seu tradutor alemão, Curt Meyer-Clason, no período de 23 de janeiro de 1958 a 27 de agosto de 1967. O estabelecimento dessa edição teve como fundamento os pressupostos teóricos da Crítica Textual, no que diz respeito à definição da edição e dos procedimentos gerais empregados para o estabelecimento do texto em questão, especificamente, epistolográfico.