O artigo analisa as relações sociais em três narrativas de Guimarães Rosa: o romance Grande sertão: veredas e os contos “Meu tio o Iauaretê” e “Famigerado”. A leitura das relações sociais sob contexto rural ocorre pela investigação das mediações da voz narrativa, a partir das interlocuções sociais propostas nas três ficções. A centralidade do narrador e a dialética com o interlocutor são elementos deste estudo, apontando a contradição social nas falsas interlocuções representadas ficcionalmente. O artigo também discute as concepções a respeito das relações sociais em Guimarães Rosa nas análises de Willi Bolle, Roberto Schwarz, Walnice Galvão, Antonio Candido, Ángel Rama, Luís Augusto Fischer, Ana Paula Pacheco e Luís Bueno.
Este trabalho toma como corpus o conto “Famigerado”, do livro Primeiras estórias (1988), de Guimarães Rosa e tem como base a escrita do autor e a postura estética por ele assumida. Nesse sentido, o objetivo do ensaio é analisar a linguagem empreendida por Guimarães nesse conto e as implicações dela para a narrativa, assim como a relação com o espaço no qual ele é ambientado, o sertão. Para tal, foram utilizados Bosi (1985) e Coutinho (2004), cujos estudos voltam-se à historiografia da literatura brasileira, dando margem à compreensão do encadeamento de eventos literários nacionais; ainda, Gotlib (1998) e Castro (1993), que dão suporte à análise da estrutura do conto de um modo geral e daqueles feitos por Rosa (1988); Bachelard (2008) e Brandão (2013), que se dedicam à investigação do espaço fundado na literatura a partir do imaginário; e, por fim, Vanoye (1987) e Holanda (1992), cujos textos dão conta da experiência da linguagem.
Diferentemente de outras teorias mais próximas da retórica, a semiótica da Escola de Paris nunca foi muito pródiga ao tratar dos problemas de persuasão e argumentação. A partir de uma constatação simples como essa, procuramos, neste artigo, pôr à prova certos dispositivos semióticos que têm suas consequências nesse domínio, a começar pela problemática modal do crer e do saber. Seus valores são examinados num tipo de situação específi ca, a saber, quando as personagens confrontadas se acham em circunstância de ameaça imediata a sua integridade física. Nesse sentido, discutimos três tópicos principais: (i) a interação dos valores modais do saber e do crer, componentes de um mesmo universo cognitivo; (ii) as modulações tensivas do medo e das paixões correlatas; (iii) as formas de raciocínio inferencial mobilizadas pelas personagens do relato, e notadamente as ilações abdutivas postas em cena. O texto escolhido para a verifi cação do alcance e dos limites de tais dispositivos semióticos é o conhecido conto de Guimarães Rosa, ?Famigerado? (Primeiras estórias, obra originalmente publicada em 1962).
O conto Famigerado, de João Guimarães Rosa, lido a partir da
teoria sociológica de Pierre Bourdieu, nos auxilia a demonstrar que a
linguagem é um instrumento de dominação e violência. Criticamos a leitura
do conto que defende a ideia de que o analfabetismo possa ser equivalente
ao encontro mais primitivo com a palavra. Insistimos na tese de que o poder
simbólico perpassa as relações de poder, constituindo-as e mantendo-as.
Concluímos sustentando a hipótese de que o conto pode ser lido como uma
alegoria do encontro entre a força física do jagunço e o poder simbólico
encarnado pelo médico, narrador do conto. Tal encontro explicita a
invisibilidade da violência simbólica, tornada visível, no entanto, através
literatura.
O presente trabalho propõe-se a percorrer os caminhos da significação e da re-significação, através da análise do conto Famigerado, de Guimarães Rosa. Para isso, recorrer-se-á a uma relação entre as concepções de língua e significação de Saussure e de uma perspectiva discursiva
Partindo da hipótese de que os contos de Primeiras estórias contenham as “Segundas estórias” jamais publicadas, este artigo propõe um método de leitura para o livro como um todo exemplificado com a análise de um deles, “Famigerado”.
A partir da constatação do valor polissêmico do signo verbal, Guimarães Rosa, no conto “Famigerado” do livro Primeiras estórias, traz à baila a reflexão sobre o poder do discurso letrado e o eterno desejo do homem de tomar posse do conhecimento. Com base nesse conto, este trabalho pretende meditar sobre a faculdade do discurso de malear a palavra, dobrando-a de acordo com conveniências preestabelecidas. Dessa forma, o domínio da palavra será examinado como estratagema simbólico para imposição de uma concepção de mundo mais em consonância com interesses de grupos ou classes que exercem as prerrogativas de senhores do saber.
As situações práticas de comunicação envolvem, em geral, a atuação simultânea de símbolos, índices e ícones. A semiose de um texto literário não é diferente, o que torna praticamente impossível isolarmos um texto puramente simbólico, indexical ou icônico. Podemos, todavia, identificar contextos em que um desses modos de representar sobressai aos demais, tornando-se determinante para a compreensão dos efeitos expressivos que o texto busca ressaltar. O objetivo deste artigo é descrever situações de leitura nas quais a ênfase em cada uma dessas três formas de representação determina a apreensão de sentidos específicos nos poemas e narrativas examinados. Com essa finalidade, valemo-nos do aporte teórico proveniente da Teoria Geral dos Signos, cuja base é o pensamento do filósofo norte-americano Charles Sanders Peirce, do qual destacamos a segunda tricotomia dos signos, centrada nas relações possíveis entre as representações e seus objetos. Os conceitos são retomados inicialmente em seu sentido teórico geral para, em seguida, serem aplicados ao contexto específico da linguagem literária, a partir de comentários sobre poemas e narrativas de autores representativos da literatura brasileira, como Manuel Bandeira, João Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto, entre outros. Mais do que traçar um esquema de classificações, as leituras propostas pretendem demonstrar como a apreensão dos componentes simbólicos, indexicais e icônicos presentes nos textos examinados implicam diferentes estratégias de cognição do fenômeno literário.
Partindo do princípio de que nenhuma explicação literária prescinde
de um fundamento lingüístico, o trabalho tem por objetivo caracterizar
sucessivamente o português no Brasil, o falar sertanejo e o estilo
rosiano, para, finalmente, a título de exemplo, fazer o levantamento
e a análise de alguns fatos estilísticos, presentes no conto "Famigerado",
de Primeiras estórias.
O trabalho estuda personagens e ação de quatro contos da coletânea Primeiras estórias de Guimarães Rosa, aproximando-os da adaptação dessas narrativas realizada por Pedro Bial no filme intitulado Outras estórias. O objetivo é comprovar a hipótese de que determinados protagonistas dessas composições, de um lado, constituem retomadas de arquétipos fixados no nosso imaginário cultural e, de outro, refletem as condições sociais do país. O elemento principal entre aqueles que Pedro Bial toma para estabelecer a relação entre os textos que compõem o filme, de modo a formarem uma narrativa unificada, é representado justamente pelas personagens. Entre os protagonistas/arquétipos a serem examinados estão o valentão, o rei sábio, a cinderela.
Este artigo é uma análise do conto Famigerado a partir da Teoria Sociológica. Nele, faz-se um estudo de sua forma e conteúdo a fim de identificar os fatores sociais que concorrem para tessitura do conto, bem como outros aspectos em destaques que fazem de Famigerado uma arte universal e segregadora, por apresentar uma linguagem sui generis.
O termo “masculinidade tóxica” está em voga, contudo, na literatura brasileira, na década de 60 já era possível encontrar personagens que questionavam esse perfil masculino pautado na força bruta, na agressividade e na não demonstração de sentimentos de carinho e afeto. Desse modo, neste trabalho, faremos um percurso analítico acerca de alguns dos personagens criados por João Guimarães Rosa, em Primeiras estórias, mais especificamente nos contos: Famigerado; A benfazeja; Os irmãos Dagobé; Luas-de-mel e Substância, a fim de constatar como esse autor mineiro já traçava um delicado e, ao mesmo tempo, profundo questionamento sobre a figura do homem em sociedade e desse perfil de masculinidade. Assim, percebe-se que vários personagens já nos forneciam indicativos de uma masculinidade plural, como a defendida em nossa época, ou seja, que busca se afastar de modelos estáticos, pré-concebidos e estereotipados. O que, por sua vez, indica que essas narrativas proporcionam reflexões quanto a percepção e evolução da compreensão da masculinidade em nossa sociedade.
O presente texto avalia alguns aspectos de manifestação das emoções na linguagem, a partir de dois processos de construção de narrativas: o primeiro parâmetro está centrado no contraste entre factum e fictum e o segundo, no contraste entre mundo possível e mundo vivido, destacando-se as modalizações de dicto e de re no interi or desses mundos. A título de ilustração, o texto incorpora exemplos dos contos "Famigerado" e "Desenredo", de Guimarães Rosa.
Este trabalho procura refletir sobre como grupos sociais diversos se relacionam no conto “Famigerado”, de Guimarães Rosa. O conto mostra um episódio em que o jagunço Damázio das Siqueiras vai à procura de um médico para saber o significado da palavra famigerado. Um moço do Governo tinha chamado o jagunço por essa palavra e Damázio queria saber qual era o significado do vocábulo. Ao chegar ao médico, pergunta se famigerado era algo bom ou ruim. O médico, notando todas as implicações e consequências da sua resposta, opta por oferecer o significado positivo de famigerado e todos saem bem no episódio. No conto, vemos a discussão sobre as formas de poder fundadas no patrimonialismo e patriarcalismo se estranhando, num primeiro momento, com o Estado moderno, mas se conciliando no final. A conciliação tensa de todos os poderes nos faz pensar que tanto o Estado moderno quanto as formas de poder locais se retroalimentam formando uma sociedade brasileira de tipo nova, mas que mantém hábitos e estruturas antigas. Nessa configuração social, quase nada sobra para quem não faz parte desses centros de poder.
O presente trabalho analisa a figura do “excluído” no conto Famigerado pertencente à obra Primeiras Estórias de João Guimarães Rosa (1908-1967), e a partir da Teoria Crítica da Sociedade de Herbert Marcuse (1898-1979). Com base em uma revisão bibliográfica, observa-se que na filosofia de Herbert Marcuse os excluídos despontam como sujeitos capazes de mudar a realidade que estão inseridos. No conto Famigerado verifica-se que Damázio é um notório excluído da sociedade brasileira, excluído economicamente, excluído das cidades e um não-escolarizado que não tem acesso ao conhecimento produzido em linguagem oficial. Mas Guimarães Rosa não o retrata como um incapaz, mas sim um homem que tem o poder das armas, que luta para sobreviver e ter uma vida que considera digna. Marcuse define a literatura como uma das dimensões estéticas que estabelecem negação a realidade hodierna e pode falar a linguagem e experiência dos oprimidos e excluídos.
A noção de profanação é fundamental no pensamento político de Giorgio Agamben. Segundo ele, a religião não é a esfera que liga os homens ao sagrado, mas a esfera de separação dessas duas dimensões. Nessa perspectiva, as coisas consagradas aos deuses são retiradas do livre uso humano, tornando-as indisponíveis. Radicalizando essa tese, Agamben a conjuga com a tese benjaminiana segundo a qual o capitalismo é a religião moderna. Nesse sentido, na sua produção de mercadorias, que em si mesmas são cindidas entre o valor de uso e valor de troca, o capitalismo torna cada vez mais todo e qualquer objeto consumível e trocável, mas não utilizável. Dessa forma, a religião capitalista, apropriando-se de quase todas as dimensões da vida humana, apresenta-se com improfanável, uma vez que profanar significa devolver ao uso daquilo que foi sacralizado. Partindo dessa compreensão, a interrogação a que o pensamento agambeniano convoca é a seguinte: como pensar em um uso profanado a partir daquilo que se apresenta como improfanável? Assim, este trabalho pretende mostrar como as noções de uso e profanação, com um funcionamento exemplar, evocam uma dimensão ética que parece impossível: a deposição das formas de vida produzidas pelas sociedades capitalistas.
O presente texto tem como ponto de encontro uma vereda, isto é a possibilidade de convergir um diálogo da imagem literária no conto Famigerado de Guimarães Rosa, com alguns conceitos da linguagem comum na obra Investigações Filosóficas de Ludwig Wittgenstein. Rosa e Wittgenstein são pensadores contemporâneos e inovadores na pluralidade dos conteúdos discursivos, respectivamente, na Literatura e Filosofia, que trouxeram à baila novas expressões linguísticas acerca do cerne da existência humana, a linguagem. O texto, por fim, tem o objetivo de reforçar novas experiências para o importante debate, a partir da ótica da linguagem entre a Filosofia e a Literatura.
Analisam os a narrativa fílmica de Pedro Bial Outras estórias que retoma cinco contos de Primeiras estórias, de Guimarães Rosa. O enfoque da análise são os motivos casamento e velório, que figurativizam os valores universais vida/morte, e o espaço do sertão. A partir desse recorte, propomos uma leitura que pretende demonstrar como o texto de Bial constrói a Cinderela do sertão mineiro.