O ponto de partida do ensaio é o diálogo de João Guimarães Rosa com Edoardo Bizzarri, tradutor italiano de Corpo de baile, acerca de uma única página "intraduzível " desse imenso livro de novelas. Veremos que tal página contém a fala de um "doido", o Chefe Ezequiel, que ouve e distingue coisas incompreensíveis para os demais: a linguagem da noite. Dotado de uma percepção aguçada, ele fala uma língua estranha, de conteúdos enigmáticos, freqüentemente atribuindo outros nomes para as coisas e novos significados para os nomes, ou simplesmente criando nomes motivados por inusitadas sinestesias. Brincando com a linha tênue e arbitrária que distingue as coisas do mundo, é essa linguagem obscura que desconcerta a tradução da novela "Buriti ".
O artigo busca delinear uma teoria da tradução proveniente das correspondências entre Guimarães Rosa e Edoardo Bizzarri, entre 1959 e 1967, considerando questões teóricas da tradução como: a tarefa do tradutor, de Walter Benjamin; o drama do tradutor, de Antoine Berman; tradução e língua italiana, de Giacomo Leopardi; e a (in)visibilidade do tradutor, proposta por Lawrence Venuti.
A correspondência entre Guimarães Rosa e seu tradutor italiano, Edoardo Bizzarri, evidencia um relacionamento amigável e cordial, até mesmo afetuoso, marcado pela admiração mútua. Rosa frequentemente elogia e estimula Bizzarri na difícil empreitada de traduzir Corpo de baile, tarefa a que se dedicava naquele momento. Cria-se, assim, um ambiente agradável e propício à discussão das ideias. As cartas trocadas entre autor e tradutor são muito esclarecedoras em relação a vários aspectos de Corpo de baile e da obra rosiana em geral, o que faz dessa correspondência importante documento, não só para o conhecimento dos processos de tradução, mas também para o estudo da obra do autor mineiro. É o que se revela no longo debate que travam autor e tradutor acerca da inclusão ou não, na edição italiana, do “Coco de festa do Chico Barbós”, uma das epígrafes de Corpo de baile. Neste trabalho, acompanhamos essa discussão, que fornece informações preciosas para se pensar as tão propaladas relações entre a cultura popular e a chamada alta cultura na obra de Guimarães Rosa.
As cartas que Guimarães Rosa trocou com tradutores de sua obra, devidamente reunidas e organizadas por pesquisadores, têm fornecido um material inesgotável de análise e propiciado um fértil debate sobre seu projeto pessoal de escrita, bem como sobre os processos e produtos da tradução literária. Neste artigo, procuramos explorar a correspondência do escritor com três de seus tradutores visando a ressaltar questões ligadas à tradução da obra rosiana emitidas tanto pelo autor como por seus tradutores. Nas cartas a Edoardo Bizzarri, Curt Meyer-Clason e Harriet de Onís, observa-se que Guimarães Rosa estabelece um sólido vínculo de cooperação, que reverte diretamente nas obras traduzidas. Os argumentos e as reflexões trocadas entre autor e tradutores deixam entrever a concepção de escrita literária de Rosa, sua preocupação com a recepção de seus romances e contos no exterior, bem como a visão do que seus tradutores acreditam ser a tradução literária.
Este trabalho examina a correspondência entre Guimarães Rosa e seus tradutores alemão, italiano e norte-americana, com vistas à depreensão e análise de perspectivas rosianas sobre o simbolismo sonoro. Examinam-se as reflexões sobre o tema que se podem depreender (a) das considerações gerais que Rosa faz no corpo das cartas enviadas a seus tradutores; e (b) das detalhadas instruções que ele acrescenta em anexos, para dirimir dúvidas específicas colocadas pelos tradutores. Mostra-se, pela análise das epístolas, que a criação linguística rosiana tende a abarcar de forma deliberada e até certo ponto calculada a sonoridade sugestiva, por meio de singulares onomatopeias, aliterações, assonâncias e padrões rítmicos, resultando em um simbolismo sonoro. Conferindo carga expressiva, força e plasticidade ao texto, o simbolismo sonoro é um importante aliado nas estratégias rosianas de privar o leitor da ?bengala dos lugares comuns? (carta a Harriet de Onis) e de convidá-lo a ter com a língua uma relação que não seja unicamente ?lógico-reflexiva? (Carta a Edoardo Bizzarri). Mostra-se ainda que, no que tange às formas como dialogam com as teorias linguísticas, as reflexões e atitudes tradutórias de Rosa, tendendo à recusa do princípio da arbitrariedade do signo, apresentam convergências parciais com discursos teóricos que sustentam o simbolismo sonoro, em especial os de Jespersen e Jakobson.
Centro de Comunicação e Expressão. Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução
Esta dissertação tem como objetivo analisar o discurso ambíguo de Riobaldo e de como a tradução italiana de Edoardo Bizzarri, através da experiência-reflexão, lida com esse importante aspecto da narrativa em Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. Além disso, e através da correspondência entre Guimarães Rosa e seu tradutor italiano, procuramos trazer à tona uma série de postulados teóricos dos Estudos da Tradução e da Teoria Literária. Guimarães Rosa sugere ao tradutor traduzadaptações capazes de preservar o modo de deslocar de sua linguagem para que a tradução crie também um devir com a língua. Para analisar o problema sobre o discurso ambíguo de Riobaldo, utilizamos os escritos de Giorgio Agamben, Willi Bolle, Maurice Blanchot e Primo Levi. Para os aspectos da teoria da tradução esta pesquisa fundamenta-se, principalmente, em Antoine Berman, Walter Benjamin, Jacques Derrida e Lawrence Venuti. Para discutir o processo de escritura como devir e a relação do sujeito com esse devir, utilizamos Gilles Deleuze, Michel Foucault e Roland Barthes.
Nesta pesquisa, discute-se a recepção da tradução italiana do livro Grande Sertão: Veredas (1956), de João Guimarães Rosa, realizada por Edoardo Bizzarri e publicada na Itália, em 1970, pela editora Feltrinelli. A descrição é feita sob três aspectos: a materialidade do livro, a perspectiva linguística e a dimensão mitológica. A partir desta última criou-se nesta tese a noção de mitotradução, baseada na teoria novalisiana de tradução mítica e na concepção de romance mitomórfico de Benedito Nunes. O texto em Língua Italiana foi analisado segundo os Estudos Descitivos da Tradução, na linha de Gideon Toury, e os modelos de descrição sugeridos por Lawrence Venuti, divisando o modo pelo qual o tradutor se torna coautor. A correspondência entre Rosa e Bizzarri é vista como uma guia seguida no processo traducional. A recepção da tradução na Itália, especialmente em Roma, é analisada através de entrevistas feitas a leitores universitários e ao público em geral.
Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas
Este trabalho pretende analisar três aspectos temáticos da narrativa rosiana “Campo Geral”, a saber, o olhar, enquanto representação da inadequação de Miguilim perante a vida; as estórias, como símbolo de sua sensibilidade poética; e a religiosidade, no que tange ao desenvolvimento de sua fé ao longo do texto. Com o intuito de observarmos como o tradutor Edoardo Bizzarri os reescreveu na língua italiana, nosso objetivo é o de refletir sobre o texto em italiano, partindo das seguintes questões: como se deram as escolhas do tradutor com relação aos vocábulos cujo significado é desconhecido ou diversificado para o leitor italiano? Suas soluções tradutórias seriam mais explicativas ou criativas? Para tanto, buscamos entender o ato de traduzir como sendo uma analogia da terceira margem, ou seja, como uma ação que perpassa tanto a língua de partida (margem de cá), quanto à de chegada (margem de lá), fazendo da tradução uma linguagem própria, que se constrói em meio as diferenças entre as línguas. Dessa forma, para embasarmos nossa proposta, partimos de alguns aportes teóricos propostos por Walter Benjamin (2001), no que diz respeito à questão da traduzibilidade de cada texto, e de Antoine Berman (2007), ao enxergar a tradução como sendo experiência nela mesma, ou seja, que nasce da vivencia de quem a está conduzindo. Nesse sentido, nossa metodologia configurou-se dentro do tema proposto, levantando as principais características do texto original e analisando-as em concomitância com o texto traduzido, além disso, recorremos ao uso das ferramentas computacionais do programa WordSmith Tools, propostas pela Linguística de Corpus, com as quais pudemos ter acesso às palavras-chaves relacionadas aos temas em questão, bem como às linhas de concordâncias e número de recorrência dessas palavras no texto. Sabendo que os livros de Guimarães Rosa são repletos de imagens locais e de construções linguísticas apuradas, observamos que as opções tradutórias de Bizzarri procuraram manter a especificidade da narrativa rosiana, mas com algumas adaptações, aproximações, ou mesmo explicações dos vocábulos em que as diferenças linguístico/culturais prevalecem.
Esta dissertação é um estudo da correspondência de Guimarães Rosa com seus tradutores - Curt Meyer-Clason, Edoardo Bizzarri e Harriet de Onís, que verteram suas obras respectivamente para o alemão, o italiano e o inglês - buscando inicialmente destacar nas cartas as peculiaridades específicas do discurso epistolar, para investigar em seguida aspectos da vida e obra do escritor. Tal investigação privilegia a análise e interpretação dos enunciados das cartas com o objetivo de mostrar a manifestação e encenação da subjetividade do escritor, e os conceitos estéticos que elabora e explica aos seus tradutores, explorando as aproximações e tensões sob as quais essa subjetividade do escritor, e os conceitos estéticos que elabora e explica aos seus tradutores, explorando as aproximações e tensões sob as quais essa subjetividade e essa estética se organizam e se relacionam.