Programa de Estudos Pós-Graduados em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem
Esta tese se propõe analisar uma das vozes que compõem o discurso de Riobaldo, personagem-narrador do romance Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa. A análise se pautará na voz da figura materna, uma vez que consideramos haver uma presença determinante dessa voz que, representando a mulher pobre, mestiça e totalmente desprovida de poder e prestígio social, será reverenciada pelo narrador do romance, tomando corpo em seu discurso. O objetivo, assim, é investigar e demonstrar que essa voz é preponderante na instauração do sujeito materializado nesse discurso e determinante na condução do enredo, na travessia empreendida por Riobaldo. A preponderância dessa voz se estabelece por ser uma voz social significativa no que diz respeito ao processo de formação do narrador, que viveu apenas com a mãe até a adolescência e carregará sua influência até o final da narrativa. A partir das marcas enunciativas e discursivas que ancoram a presença materna no discurso de Riobaldo, a análise será feita tendo em vista o contexto textual em que a voz aparece, o contexto sócio-histórico brasileiro que se evidencia no romance rosiano e a participação da figura materna no processo de constituição/formação do sujeito, comprovando que, em seu discurso, ele anuncia e denuncia a influência, a marca da mãe em sua visão de mundo e na maneira como conduz sua epopeia. Para proceder-se à análise foi efetuado um recorte dos trechos em que o narrador menciona a mãe, situando as referências na sequência da narrativa, na linearidade do enredo e em relação ao tempo/espaço (cronotopo) correspondente à ação relatada. Essas referências serão consideradas marcas enunciativo-discursivas, conforme se verá no desenvolvimento da análise, reveladoras da posição ocupada pela mãe no discurso desse narrador/ personagem e, também, na totalidade do enredo de Grande sertão: veredas. Nossa hipótese é a de que a presença dessa mãe norteou a trajetória de Riobaldo no ser(tão), demonstrando que no emaranhado de conflitos há uma figura materna que o constitui, acompanha e guia, determinando a condução do enredo e, ao final, a travessia empreendida por ele. A análise será fundamentada na perspectiva dialógica do discurso, apresentada por Bakhtin e o Círculo. Partimos do princípio de que o discurso de Riobaldo é dialógico, povoado de inúmeras vozes, como qualquer discurso, e que a voz da mãe não é apenas uma delas, mas é constitutiva desse sujeito. Consideramos, ainda, que o personagem-narrador, em Grande sertão: Veredas, veicula um discurso e é por ele constituído, o que viabiliza a análise do discurso da personagem, investigando as vozes que o compõem. Nessa perspectiva apresentamos as formas de presença da palavra alheia no discurso, situando a voz materna como uma palavra autoritária no discurso de Riobaldo. Assim, os conceitos bakhtinianos de discurso, palavra autoritária, dialogia, polifonia, ato discursivo, cronotopo, bem como a concepção de sujeito pressuposta por essa teoria, funcionam como bases para analisar o discurso de Riobaldo, situando a figura materna e demonstrando, assim, que na travessia efetuada a mãe está incorporada preponderantemente no corpo discursivo de Riobaldo