O artigo analisa as relações sociais em três narrativas de Guimarães Rosa: o romance Grande sertão: veredas e os contos “Meu tio o Iauaretê” e “Famigerado”. A leitura das relações sociais sob contexto rural ocorre pela investigação das mediações da voz narrativa, a partir das interlocuções sociais propostas nas três ficções. A centralidade do narrador e a dialética com o interlocutor são elementos deste estudo, apontando a contradição social nas falsas interlocuções representadas ficcionalmente. O artigo também discute as concepções a respeito das relações sociais em Guimarães Rosa nas análises de Willi Bolle, Roberto Schwarz, Walnice Galvão, Antonio Candido, Ángel Rama, Luís Augusto Fischer, Ana Paula Pacheco e Luís Bueno.
No quadro social imaginado por Grande sertão:veredas, jagunços heróicos e bandidos dosertão dividem o Bem e o Mal, sobre o panode-fundo da Primeira República. Em Primeirasestórias, de outro modo, a nova matéria histórica, remetendo ao quadro da modernização brasileira nos anos J.K., parece colocarem xeque a estetização literária. O ex-jagunço é agora um “homem livre pobre”. No duelo –apenas verbal – entre sertão e cidade, o lugarde classe do escritor vem à tona.
As situações práticas de comunicação envolvem, em geral, a atuação simultânea de símbolos, índices e ícones. A semiose de um texto literário não é diferente, o que torna praticamente impossível isolarmos um texto puramente simbólico, indexical ou icônico. Podemos, todavia, identificar contextos em que um desses modos de representar sobressai aos demais, tornando-se determinante para a compreensão dos efeitos expressivos que o texto busca ressaltar. O objetivo deste artigo é descrever situações de leitura nas quais a ênfase em cada uma dessas três formas de representação determina a apreensão de sentidos específicos nos poemas e narrativas examinados. Com essa finalidade, valemo-nos do aporte teórico proveniente da Teoria Geral dos Signos, cuja base é o pensamento do filósofo norte-americano Charles Sanders Peirce, do qual destacamos a segunda tricotomia dos signos, centrada nas relações possíveis entre as representações e seus objetos. Os conceitos são retomados inicialmente em seu sentido teórico geral para, em seguida, serem aplicados ao contexto específico da linguagem literária, a partir de comentários sobre poemas e narrativas de autores representativos da literatura brasileira, como Manuel Bandeira, João Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto, entre outros. Mais do que traçar um esquema de classificações, as leituras propostas pretendem demonstrar como a apreensão dos componentes simbólicos, indexicais e icônicos presentes nos textos examinados implicam diferentes estratégias de cognição do fenômeno literário.
O conto Famigerado, de João Guimarães Rosa, lido a partir da
teoria sociológica de Pierre Bourdieu, nos auxilia a demonstrar que a
linguagem é um instrumento de dominação e violência. Criticamos a leitura
do conto que defende a ideia de que o analfabetismo possa ser equivalente
ao encontro mais primitivo com a palavra. Insistimos na tese de que o poder
simbólico perpassa as relações de poder, constituindo-as e mantendo-as.
Concluímos sustentando a hipótese de que o conto pode ser lido como uma
alegoria do encontro entre a força física do jagunço e o poder simbólico
encarnado pelo médico, narrador do conto. Tal encontro explicita a
invisibilidade da violência simbólica, tornada visível, no entanto, através
literatura.
O conto "Famigerado", de Primeiras estórias, permite considerar as pectos da violência na obra de Guimarães Rosa, tal como se configuram no momento em que o jaguncismo, inseparável do mandonismo sertanejo tradicional, sofre mudanças ligadas à urbanização e à modernização, indicadas pelo conjunto do livro. A regra sertaneja da aliança e da vingança, e a inconsistência da lei no sertão, e no Brasil, dão lugar a uma rede de ambivalências condensada no duplo sentido antitético da palavra ?famigerado?. Relações com Sagarana, Grande sertão e Corpo de baile sugerem que a violência fundante, no Brasil, que persiste através das mudanças modernizantes, transparece na obra rosiana como um karma desafiando a sua superação.
O objeto de estudo desta tese são algumas das narrativas elaboradas por João Guimarães Rosa e compiladas nos livros: Sagarana, Primeiras Estórias, Estas estórias, Ave, palavra, Corpo de Baile e Grande Sertão: Veredas. A análise deste corpus tem a finalidade de verificar até que ponto essas narrativas ajudam a repensar o conceito de homem cordial presente no pensamento sociológico brasileiro, tendo em vista, sobretudo o desenvolvimento deste conceito no ensaio Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda (doravante SBH). Dada a inscrição dessas narrativas entre o sertão arcaico e a fundação do ambiente urbano brasileiro, mesmo panorama discutido por SBH, a partir da argumentação desenvolvida, concluiu-se que há um reaproveitamento estético de algumas das principais discussões desenvolvidas por SBH, sobre as raízes da sociedade brasileira. Acredita-se que tal reaproveitamento estético permite que a cordialidade ressoe no corpus analisado, o que nos leva a forjar aqui o qualificativo de poética da cordialidade para as narrativas produzidas por JGR e a enxergar no perfil biográfico desse autor um intérprete do Brasil.
Esta dissertação trata da análise, do ponto de vista literário, da tradução intersemiótica/adaptação cinematográfica de cinco contos do livro Primeiras estórias, de Guimarães Rosa: "Famigerado"; "Os irmãos Dagobé"; "Sorôco, sua mãe, sua filha"; "Nada e a nossa condição"; e "Substância", que compõem o enredo do filme Outras Estórias (1999), do jornalista e diretor Pedro Bial. Trata-se de um estudo comparativo de cada um dos contos a partir das análises literária e cinematográfica, bem como da interseção das duas linguagens. Destacam-se as características da linguagem verbal escrita e as soluções encontradas para a reescrita no suporte verbal e imagético, através da opção de montagem de um único enredo composto pelos cinco contos.
Faculdade de Letras, Departamento de Letras Neolatinas
A pesquisa presente realça as variações das traduções franesas, de 1910 até 2004, de oito contos dos escritores brasileiros Machado de Assis e Guimarães Rosa. A partir de um corpus de oito contos (quatro de cada autor), confrontamos os trabalhos de doze tradutores, de acordo com a metodologia de Berman. Definimos, primeiramente, os problemas encontrados na tradução e na retradução, expondo suas principais teorias na França, do século XVI até os dias de hoje. Em seguida, estudamos as relações literárias França-Brasil e a recepção das obras brasileiras na França, assim como o "horizonte das traduções". Na segunda parte, apresentamos os "sistematismos" da escrita de Machado (a distância para com o realismo e a presença do narrador no texto) e os "intraduzíveis" de Guimarães Rosa (o particular e o universal bem como a língua recriada), mostrando como os tradutores resolveram esses "particularismos". Depois de ter apresentado os primeiros tradutores, que apresentam, geralmente, uma tendência "etnocêntrica" e estão sempre prontos para "naturalizar" a obra, e, em seguida os retradutores, com uma tendência "estrangeirizante" e "literalizante", investigamos, a partir dos textos, os seus "projetos de tradução", suas "éticas", suas "posições tradutivas" e suas "bibliotecas imaginárias". Enfim, comparamos nos dois autores a maneira como os aforismos, as expressões do popular e da loucura são traduzidos. Este trabalho mostra a variedade de tons e sentidos dados a um texto original, na medida em que cada tradutor materializa diferentes sentidos possíveis da obra faz com que ela tenda a ser retraduzida.
Análise das transposições realizadas, para o vídeo e para o cinema, do conto "Famigerado", de Guimarães Rosa, além da análise da narrativa "Cara-de-Bronze" enquanto texto transemiótico. Para este estudo foram utilizados, sobretudo, os conceitos de transcriação, de Haroldo de Campos, e de transtexutalidade, de Gerard Genette. Também foi feito um lavantamento das transposições realizadas a partir da obra rosiana para o sistema de signos audiovisual um estudo comparativo das linguagens cinematográfica, vídeográfica e televisiva, entre si, e com a linguagem verbal.
O objetivo desta tese é realizar leituras intersemióticas dos contos rosianos Famigerado, A menina de lá, A terceira margem do rio, Sequência e A Benfazeja e suas respectivas ilustrações realizadas por Luís Jardim para o livro Primeiras estórias. Ao realizar as leituras mostraremos que a relação palavra/imagem, sugere uma forma de recriação da linguagem. Os resultados apresentados foram formulados a partir das teorias gerais da ilustração em consonância com a base teórica de Umberto Eco sobre os aspectos da semiose hermética, presentes no livro Os limites da interpretação (1990).
Este trabalho analisa os personagens SeteMeis, de O resto é silêncio, Érico Veríssimo, Damázio, o
jagunço do conto “Famigerado” (Primeiras estórias), de Guimarães Rosa, e Rael, da obra Capão
pecado, Ferrez. Em três momentos diversos da História e da Literatura Brasileiras, autores
diferentes constroem o discurso de personagens que historicamente sempre estiveram à margem da
sociedade.
Moramos na linguagem. Muito mais que um instrumento transmissor de ideias – e logo, algo secundário em relação a algum ‘mundo real’ - composto de sinais, é por ela que temos acesso ao mundo e, inclusive, ao que chamamos subjetividade. Famigerado, conto de João Guimarães Rosa que narra a inquietação de um perigoso jagunço a respeito do epíteto que lhe foi dado, bem como do médico que é consultado a respeito do significado do apelido, é, neste sentido, uma oportunidade de compreendermos os diversos níveis de análise da linguagem, trabalhada sob dois níveis – ontologicamente distintos: o apofântico – do discurso, cujos níveis de análise correspondem ao semiótico, e seus subníveis, o sintático, o semântico e o pragmático, e ao nível racional-comunicativo – e o hermenêutico – relativo à práxis, ao contexto, ao mundo vivido. Noutras palavras, a linguagem trabalha não apenas no dito, mas também no não dito.
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